GT 42. Etnografias contemporâneas das diásporas médio-orientais na América Latina e no espaço global

Coordenador(es):
Gisele Fonseca Chagas (UFF - Universidade Federal Fluminense)
Silvia Montenegro (CONICET)

Este grupo de trabalho pretende reunir pesquisadores que discutam os diferentes processos de construção de identidades no contexto das comunidades diaspóricas médio-orientais na América Latina, buscando incluir também as pesquisas daqueles antropólogos que realizam trabalho de campo sobre esses processos no Oriente Médio e no espaço global. O intuito é refletir sobre as dinâmicas locais e os fluxos transnacionais que envolvem essas configurações identitárias através do movimento e circulação de pessoas, instituições, objetos e ideias numa perspectiva etnográfica. O GT pretende trazer para o debate o papel da etnografia na compreensão das diferentes dimensões que abarcam tais processos e servir como espaço para troca de experiências de pesquisa e reflexões metodológicas sobre o estudo do islã e outras vinculações religiosas, as identidades e conflitos étnicos e nacionais, as questões de gênero e temas emergentes tais como refugiados, exilados e deslocados por guerras e conflitos recentes.

Palavras chave: Diásporas médio-orientais na América Latina; espaço global; pertencimentos religiosos, étnicos e nacionais
Resumos submetidos
A comoditização do sufismo marroquino: estética e invenção da tradição na tariqa Hamdouchiya
Autoria: Bruno Ferraz Bartel (Seeduc)
Autoria: O artigo visa compreender os efeitos da política de valorização do sufismo – via mística do Islã – na confraria marroquina Hamdouchiya. Os aspectos estéticos associados aos legados imateriais desse grupo, tal como o estilo da música Hamadsha, têm sido valorizados dentro da lógica da comoditização das tradições em curso no país nos últimos anos. As expressões devocionais presentes no sufismo marroquino muitas vezes são correlacionadas e reconhecidas como “produtos culturais” pelas instituições governamentais. Tais “rótulos” foram recentemente construídos e patrocinados pela monarquia de Mohammed VI entre as comunidades sufis do país. O contexto atual tem produzido novas questões entre os discípulos da Hamdouchiya, principalmente aquelas relacionadas às formas de utilização do patrimônio imaterial do grupo em festivais de música sufi e o impacto gerado por essas apresentações no uso das melodias, ritmos e harmonias musicais. Se, por um lado, os festivais possibilitam uma maior inserção e visibilidade na esfera pública, por outro lado, constantes desafios se colocam quanto a organização e execução dos conteúdos selecionados como parte de uma “tradição” sufi. Esta pesquisa faz parte da revisão de dados etnográficos desenvolvidos no Marrocos entre 2016 e 2017, nas cidades de Safi, Essaouira e Fez. Argumenta-se que o novo momento vivido pelos discípulos da Hamdouchiya converge para um processo de comoditização das tradições. Isso significa repensar os usos das práticas devocionais dos locais de culto. A estratégia de resgate dos conteúdos musicais pelos discípulos da Hamdouchiya faz parte da promoção do turismo vigente no país subvencionado, muitas vezes, pela própria monarquia. Entretanto, a organização e participação nos festivais têm provocado uma série de novas preocupações para os discípulos. A primeira delas seria a conciliação das atividades religiosas dos locais de culto com as oportunidades de se apresentar em festivais de música sufi. A segunda, refere-se às críticas relacionadas ao caráter mercantil das aparições públicas associadas a uma atividade vilipendiosa e, também, à questão da autenticidade das performances provenientes da baixa qualidade do estilo da música Hamadsha apresentada nos eventos. Tais preocupações por parte dos interlocutores apontam para a existência de uma “estética da autenticidade”, isto é, práticas de criação e consumo cultural que promoveriam concepções modernas sobre o self e a sociedade. As formas devocionais da Hamdouchiya, antes definidas a partir do rótulo de “folclore”, hoje reaparecem por intermédio da noção de “cultura”, como uma maneira de garantir aos discípulos das confrarias o acesso ao discurso de modernidade no Marrocos contemporâneo.
Casamentos sírios em tempos de guerra e refúgio: uma reflexão a partir de uma cidade do estado de São Paulo.
Autoria: Juliana Carneiro da Silva (Fapesp)
Autoria: O presente artigo discute as transformações operadas pela guerra e pelo refúgio na (não) realização de casamentos de deslocados pelo conflito sírio em uma cidade do estado de São Paulo. Embora as literaturas sobre parentesco no Oriente Médio (Honeysett 2013; Obeid 2016; Rabo 2008) e no islã (Tucker 2008), assim como nas diásporas médio-orientais (Jardim 2009; Peters 2006), postulem, respectivamente, a centralidade do casamento na configuração da vida adulta, no bem estar individual e na re-articulação de parentes na distância geográfica, os dados da pesquisa de campo que conduzo desde 2018 entre deslocados pelo conflito sírio, majoritariamente muçulmanos, apontam para um possível tensionamento da instituição do casamento. Nota-se particularmente que a realização de novas uniões se torna em muitos momentos problemática, na medida em que elementos da vida na guerra e no refúgio parecem desafiar os ideais acerca daquela instituição. Assim, um dos objetivos deste artigo é mostrar como as condições de vida de deslocados pelo conflito sírio em uma cidade do estado de São Paulo e a existência daquele conflito atuam como catalisadores de mudanças nos rumos do casamento no contexto que estudo. Por ora, os dados de campo têm apontado para duas tendências com relação à realização de novas uniões: (a) casamentos sendo realizados de maneira diferente do que os interlocutores consideram ideal ou (b) não sendo realizados em absoluto, implicando em uma extensão do solteirismo, o que também se afasta do ideal. Para abordar estas questões, o artigo trabalhará, a partir de narrativas e comentários sobre a (não) realização de novas uniões por parte de deslocados pelo conflito sírio em uma cidade do estado de São Paulo, as intersecções entre o casamento, o conflito sírio e o processo de refúgio que ele engendrou, os ideais acerca daquela união, os caminhos que o casamento tem tomado no contexto que estudo e as divergências e conflitos que surgem a partir daí. Apoio: Fapesp (desde 01/12/2019) (processo nº 2018/16738-2, Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP)); Auxílio para pesquisa de campo: Fapesp entre junho e julho de 2018 (processo nº 2016/09596-1, Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP)) e Auxílio Financeiro Estudante do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social (PPGAS) da UFSCar em janeiro de 2019.
Daam e sumud: noções de força e resiliência entre refugiados palestinos do conflito sírio
Autoria: Helena de Morais Manfrinato Othman (USP - Universidade de São Paulo)
Autoria: Em finais de 2015, uma centena de refugiados palestinos do conflito sírio foi acolhida em uma ocupação urbana no Centro de São Paulo. Nascidos e criados em campos de refugiados na Síria, sua vivência do refúgio – e as dificuldades vinculadas a essa condição, lançam suas raízes em guerras e processos de migração forçada anteriores à guerra da Síria. Vivendo sob a governança de uma organização internacional e com acesso restrito à cidadania no país hospedeiro, sabem o que é lidar com a escassez de recursos e a dependência de ajuda humanitária. Novamente refugiados no Brasil, em razão, agora, do conflito sírio, viram-se, mais uma vez, em uma situação de vulnerabilidade. Diante das condições descritas, meus interlocutores da ocupação Leila Khaled descrevem-se como samidin, resilientes, porque resistentes, agindo com bravura na adversidade. Esta noção ancora-se na própria experiência de sofrimento, que ensina a ser forte, princípio acolhido desde a criação dos filhos. Ao mesmo tempo, a noção de sumud é coextensiva a de sangue (daam), substância que contém força, ligada a terra ancestral, força acionada pelas múltiplas dificuldades da vida no refúgio. A ativação da conexão com a terra pela memória dos antepassados é repassada às próximas gerações, impondo-se contra o risco do esquecimento, ao passo que cria, no presente, homens e mulheres fortes diante da dura vida no refúgio.
De pontes, conexões e fluxos: uma descrição etnográfica de práticas sociais na comunidade Hizmet no Brasil.
Autoria: Liza Dumovich Barros (sem vínculo)
Autoria: Essa apresentação visa a discutir como participantes do Movimento Hizmet no Brasil mobilizam práticas sociais no seu empenho em estabelecer uma comunidade no país anfitrião, e apontar para os efeitos que são produzidos durante esse processo. O Movimento Hizmet, também conhecido como Movimento Gülen, é um movimento turco islâmico transnacional sob a autoridade carismática do líder religioso Fethullah Gülen. A palavra turca “hizmet” significa “serviço”, que no contexto em questão adquire um conteúdo religioso. Esse “serviço religioso” possui uma dimensão individual, de formação de si, e uma dimensão coletiva, de construção da comunidade e difusão da visão de mundo de Gülen, o que implica emigrar da Turquia e forjar a sua própria hicret (em referência à migração do Profeta Muhammad de Meca para Medina em 622 AD). Apesar de haver uma significativa diversidade de motivações e interesses entre os seguidores de Gülen, se engajar no que eles chamam de hizmet significa aderir ao projeto “civilizacional” do seu líder religioso. Em 2015, participantes do Movimento haviam se estabelecido em cerca de 150 países, incluindo o Brasil, onde formam uma comunidade de aproximadamente 300 membros. Uma profunda mudança de conjuntura aconteceu quando, em julho de 2016, o presidente turco Recep Tayyip Erdoğan acusou seu antigo aliado Fethullah Gülen de ser o mandante da tentativa de golpe fracassada na Turquia. Iniciou-se uma série de medidas contra o líder religioso e seus seguidores, afetando amplamente a situação política, econômica e social do Movimento Hizmet, tanto dentro quanto fora das fronteiras turcas. Perseguição política e ostracismo social levaram muitos participantes a fugir da Turquia. A maioria desses emigrantes forçados, assim como aqueles que emigraram voluntariamente da Turquia antes do golpe fracassado, têm se tornado refugiados ou solicitantes de asilo na Europa, nos Estados Unidos e no Canadá, além de alguns no Brasil. Numa tentativa de entender como se dá o encontro dos membros da comunidade com a sociedade brasileira, sobretudo após o evento crítico de 2016, esse work lança mão de exemplos etnográficos que mostrem discursos e práticas performados por membros da comunidade no seu esforço de interagir e se relacionar com brasileiros, e releva alguns dos efeitos das suas ações e práticas sociais durante esse processo. Enquanto os representantes da comunidade veem as instituições locais do Hizmet como pontes entre ela e a sociedade brasileira, as mulheres mobilizam outras formas de conexão com agentes sociais locais. Nesse processo, fluxos de ideias, crenças e símbolos permeiam relações sociais e influenciam esse encontro de diferentes formas.
Experiências do Véu: reflexões sobre conversões , gênero e corporalidade entre as mulheres muçulmanas na Mesquita Islâmica de Juiz de Fora
Autoria: Ana Clara Alves de Oliveira (UFF - Universidade Federal Fluminense)
Autoria: O work a ser apresentado se baseia nos dados de minha pesquisa de campo realizada entre 2016-2017 na Mesquita Islâmica de Juiz de Fora. Discuto a experiência do véu muçulmano em diferentes âmbitos de análise, procurando entender porque o uso do véu é uma ação social tão impactante para os não muçulmanos e qual o sentido do véu para as mulheres que o usam. Desenvolvo uma breve análise sobre a história da confecção de discursos orientalistas enfatizando a relação entre Oriente e Ocidente e como a mulher de hijab se tornou um ícone das discussões sociais ocidentais contemporâneas. Proponho entender o islã como uma nação que funciona tanto quanto uma organização local, como uma comunidade de identificação internacional. A partir de minha experiência de campo na Mesquita Islâmica de Juiz de Fora trago dados das mulheres muçulmanas estudadas e busco trabalhar a conversão das brasileiras ao islã como um processo de construção de identidade e uma escolha pessoal de inserção social. Um processo que se inicia no corpo e com a prática se internaliza no sujeito. O véu é o ícone que norteia todo esse debate, sendo ele, um elemento estético que desempenha papel fundamental no exercício da compreensão da performance abrindo dimensões muito maiores que se tornam imbricadas na experiência vivida.
Islã material: as coisas na vida social de xiitas e sunitas de São Paulo e Rio de Janeiro
Autoria: Thaís Chaves Ferraz (UFF - Universidade Federal Fluminense)
Autoria: Unidas, materialidades e religião fazem surgir um vasto universo sociocultural: os “troços, trecos e coisas”, conforme a abrangente tradução de “stuff”, de Miller (2013), significam uma imensidão de interpretações, usos e (re)leituras. No Islã, o simbólico-religioso pode tomar a forma de adornos, vestimentas, iconografias, alimentos e presentes. O objetivo deste work é refletir sobre a presença das materialidades em vivências religiosas de comunidades do Rio de Janeiro e de São Paulo ligadas às vertentes sunita e xiita, as mais proeminentes do Islã. Através das etnografias realizadas com membros do Centro Cultural Imam Hussein e da Mesquita da Luz (RJ), Mesquita do Brás, Centro do Imam Al Mahdi de Diálogo no Brasil, Centro Islâmico Fátima Zahra, Mesquita Brasil e Mesquita do Pari (SP), que representam essas correntes sectárias nos estados citados, pretende-se trazer para o debate os modos como esses itens e bens transitam e circulam, permeando relações e práticas, compreendendo-os como parte de uma cultura material e na qualidade de detentores de lugares simbólicos nas atitudes diárias desses muçulmanos e em suas formas de experienciar o Islã.
Monastérios melquitas e dinâmicas identitárias no Líbano
Autoria: Rodrigo Ayupe Bueno da Cruz (Egresso)
Autoria: O objetivo deste work é destacar a importância dos monastérios da Comunidade Melquita como locais privilegiados para a vivência das diversas identidades mobilizadas pelos membros desta confissão no Líbano. A pesquisa foi realizada entre dezembro de 2014 e fevereiro de 2017, a partir da observação participante nas atividades monásticas desses espaços sagrados, principalmente no Couvent Saint-Sauveur, da ordem salvatoriana, e do Couvent Saint-Jean Baptiste, da ordem chouerita, que são considerados os mais importantes pelos membros desta comunidade religiosa. Os monastérios melquitas são instituições religiosas vinculadas à Igreja Greco-Melquita, que é uma das vertentes do Cristianismo Oriental. Estes espaços sagrados são aqui concebidos como lugares de interseção em virtude de serem locais performáticos de uma religiosidade de interseção no sentido de conectar dois referenciais normativos opostos do cristianismo: o católico e o bizantino. E no contexto libanês essa característica a coloca também em uma posição de interseção entre as comunidades cristãs mais importantes do país: a maronita, devido ao mesmo denominador católico, e a ortodoxa, pelo mesmo denominador bizantino. Essa religiosidade de interseção é formada por meio da prática da tradição ritual melquita, construída a partir do Rito Bizantino modificado pelas inovações latinizantes. A consequência disso é a atração de cristãos melquitas e não melquitas para esses lugares na medida em que a sua plasticidade atende as demandas de sujeitos com diferentes expectativas, tanto por um lado católico, pelo bizantino ou então pela combinação de ambos. Apesar desta religiosidade ser praticada em diversos espaços sagrados da Comunidade Melquita, os monastérios se tornam locais privilegiados para a atração multiconfessional em virtude da intensidade da performance ritual e de uma série de outras características tais como, a geografia local, o imagético e as virtudes eclesiásticas. O resultado da presença de diversas confissões, incluindo as muçulmanas, é a formação e a vivência de uma dinâmica identitária, a começar pela identidade melquita. Mas quando se trata da presença de membros de outras confissões cristãs, a identidade afirmada é a cristã. Já nas situações em que os muçulmanos estão presentes, as diferenças religiosas são momentaneamente superadas em nome de uma identidade nacional libanesa. Outra consequência dessa atração de fiéis de diversas confissões é a utilização política desses lugares por parte de lideranças melquitas no intuito de fortalecer a sua comunidade na competição interconfessional através da promoção de uma identidade de conciliador entre as diferentes comunidades religiosas do Líbano.
O parentesco árabe no contexto das migrações internacionais
Autoria: Gabrielle Da Cunha (UFSCAR - Universidade Federal de São Carlos)
Autoria: O presente work parte de uma das discussões iniciais que tem sido feita no desenvolvimento da minha pesquisa de mestrado que tem como objetivo verificar a relação existente entre a migração síria histórica com a vinda de famílias sírias refugiadas da Guerra da Síria no interior do estado de São Paulo, na cidade de Itapira. A metodologia de pesquisa escolhida foi a etnografia realizada com as famílias refugiadas sírias residentes em Itapira e para compreender a relação desses dois fluxos migratórios se faz necessário pensar o parentesco no contexto das migrações internacionais. A reproblematização do parentesco do binômio biológico-cultural para o campo simbólico feito por Schneider, Carsten e Sahlins ajuda a Antropologia a compreender novas formas de ser e se relacionar que vão além da reprodução e é um artefato imprescindível para a compreensão da dinâmica do parentesco que os deslocamentos produzem pois alteram relações, identidades, e a casa. As famílias interlocutoras e etnografadas, no período de adaptação no país, moravam na casa da tia, que veio no início do século XX, com outros familiares, amigos sírios que vieram para a cidade para fugir da guerra. Essa convivência conjunta trouxe muitos conflitos e reconfigurações dos laços de parentesco das cinco famílias, duas delas permaneceram na cidade e outras foram para os EUA, São Paulo e Minas Gerais, na cidade de Jacutinga reafirmando o que a pesquisadora Rosana Baeninger alerta sobre o Brasil ser um espaço de passagem no contexto dos novos fluxos de migração internacional que aconteceram sul global após 2010. O parentesco árabe é mais estudado no Brasil a partir das famílias árabes muçulmanas sendo um dos desafios da presente pesquisa e que também configura na importância desta, pois contribuirá para compreender como é o parentesco árabe católico visto que na Síria os católicos romanos compõem um grupo muito pequeno da população que é de maioria muçulmana e as pesquisas realizadas no Brasil investigam mais o parentesco árabe muçulmano. Os resultados iniciais obtidos levam a compreender que no parentesco árabe católico não há a existência do namoro, os pais participam nos contatos e encontros com as pessoas e famílias escolhidas pelo filho ou filha, há exigência de filhos ao casal que se casa, há o amparo do irmão mais velho as irmãs e irmãos mais novos, essas são algumas das características do parentesco árabe católico identificadas.
O ramadã e suas implicações ritualísticas a partir da antropologia da religião
Autoria: Diógenes Braga Ramos (EST)
Autoria: A proposta desse work é observar o rito do Ramadã a partir da Antropologia da Religião, analisando a mesquita Luz da Fé localizada na cidade de Campo Grande-MS. Esta escolha se dá por conta da pesquisa de mestrado que estou realizando no programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da UFMT. Para isso, contextualizarei historicamente a mesquita Luz da Fé e através de observação participante. Nas reuniões de sextas-feiras que acontecem na mesquita tenho conversado com os muçulmanos membros e participantes, como também com o Sheik da comunidade para entender como essas pessoas vivenciam e experienciam sua fé e entendem e participam do Ramadã. É importante ressaltar que apenas o olhar êmico descrito pelos muçulmanos da comunidade poderão confirmar qual a importância do Ramadã para a comunidade de fé e a relevância social que o evento do Ramadã impacta sócio-culturalmente essas pessoas. Chamo atenção que uma das dificuldades de participar das atividades religiosas e sociais com os membros da mesquita se dão por que não falo árabe e o centro da fé dos muçulmanos se constrói na língua árabe, inclusive o Sheik que cuida da religiosidade da Mesquita é egípcio e não fala português, desta forma nossas conversas, tem sido em inglês ou com um tradutor que está se tornado meu informante no processo. Umas das questões que tem despertado interesse como uma possível hipótese a ser melhor investigada é de a relação dos muçulmanos que frequentam a mesquita não só se estabelece por conta das relações espirituais, mas de que a mesquita tem um papel político, econômico e social para esses membros. Diante disso também questiono se o Ramadã não pode ser entendido como um rito que transcenda apenas a experiência religiosa, mas que possa ser observado como um elemento integrador que rompe com os paradigmas de análise do rito como apontados por grande parte dos pesquisadores que pesquisam o rito e seus desdobramentos. Outra questão que também chama atenção é de que existe uma tendência de que a manutenção do rito do Ramadã se fortalece como uma prática na comunidade religiosa por conta da memória que é estabelecida de geração a geração na estrutura familiar para que se mantenha esse rito. Para analisarmos a questão do rito e a fundamentação teórica utilizarei Michel Meslin, Jack David Eller a partir da antropologia da religião, na discussão acerca da memória, me pautarei no antropólogo Joël Candau. E nas observações relativas a religião e cultura me pautarei em Pierre Sanchis. As perspectivas teóricas sobre os muçulmanos no Brasil ainda carecem de mais pesquisas, diante disso, a proposta desse texto é apenas incentivar que possamos nos aprofundar mais nas questões sobre o crescimento e o fortalecimento dos muçulmanos no Brasil.
Origem e atualidade do sufismo na Argentina: fases de expansão e diversidade
Autoria: Silvia Montenegro (CONICET)
Autoria: Desde final dos anos 60 o sufismo teve presença na Argentina, primeiro na forma de grupos “neosufis” e posteriormente com a criação de grupos introduzidos por descendentes de imigrantes muçulmanos que viajaram por Oriente Médio na busca de mestres espirituais. Entre os anos 70 e 80 houve uma importante produção local de literatura sufi composta por traduções e revistas que divulgavam o esoterismo islámico. No final da década de 80 diversos grupos surgem de um núcleo original liderado por um psiquiatra na cidade de Mar del Plata, se vinculando todos com a Ordem liderada pelo Shaykh Nazim em Chipre. Esta comunicação analisa essas fases de expansão e o lugar da Ordem Naqshbadi -Haqqani no quadro da diversidade do sufismo na Argentina contemporánea, explicando seu atual predomínio a partir de dois eixos: 1) a construção de circuitos nacionais/globais de devoção; 2) a estratégia de “ruralização” das comunidades. Minha análise baseia-se no estudo de documentos e em work etnográfico realizado em 5 grupos da Ordem distribuídos ao longo do país assim como no conhecimento contextual sobre a presença muçulmana na Argentina e na América Latina.
Refúgio, família e humanitarismo: contribuições críticas da etnografia com mulheres do conflito sírio
Autoria: Mirian Alves de Souza (UFF - Universidade Federal Fluminense), Laís Loureço Guidinelli Nunes Ferreira
Autoria: Os discursos humanitários enfatizam uma imagem visual pré-determinada dos refugiados e a ideia de que o deslocamento resulta em perturbações nas estruturas familiares. Este artigo desafia discursos simplistas, destacando a diversidade cultural e as relações familiares entre pessoas afetadas pelo conflito sírio no Brasil e na Tunísia. Pretende-se contribuir para a produção acadêmica, ampliando o quadro no qual são apresentados os refugiados, explorando os seus diferentes status socioeconômicos, histórias pessoais e situações psicológicas. Propõe-se apresentar uma descrição mais complexa das relações familiares no exílio. O texto explora a dinâmica familiar no contexto do refúgio considerando as relações anteriores e durante a migração, o que permite desafiar a ideia de que o deslocamento afeta apenas negativamente as relações familiares. A migração forçada pode limitar relações, mas também ampliar círculos sociais e oferecer oportunidades para que códigos culturais mais rígidos possam ser desvendados. Essas descobertas mostram que as relações sociais entre refugiados devem ser analisadas com mais atenção, considerando-se outras dinâmicas de poder intersecional (LOKOT, 2018) e a categoria refugiado como uma “ampla rubrica legal ou descritiva” que inclui uma diversidade de sujeitos (MALKKI, 1995).
Segredo e Reconfigurações Identitárias entre os Druzos no Brasil
Autoria: Paulo Gabriel Hilu da Rocha Pinto (UFF - Universidade Federal Fluminense)
Autoria: A imigração de fala e cultura árabe proveniente do Oriente Médio (Síria, Líbano e Palestina) no Brasil apresentavas grande diversidade religiosa, incluindo confissões cristãs, muçulmanas e judeus. Entre esses grupos estavam os Druzos, confissão religiosa derivada do xiismo ismailita, cujo sistema religioso era baseado no conhecimento esotérico revelado apenas aos líderes religiosos (shaykhs), tendo poucos elementos compartilhados, como a crença na reencarnação. Embora a primeira instituição religiosa muçulmana do Brasil, a Sociedade Beneficente Druza, tenha sido criada pelos Druzos em Oliveira, Minas Gerais, em 1925; a natureza secreta e hierárquica do sistema religioso druzo dificultava sua transmissão para as gerações nascidas na diáspora, uma vez que essas não contavam com o contexto cultural presente nas sociedades do Oriente Médio. Essa questão já preocupava o shaykh druzo no Brasil, Nagib Assrauy, que publicou um “catecismo druzo” nos anos 60 para facilitar a transmissão da identidade às novas gerações. A partir de work de campo realizado com druzos em Belo Horizonte, Oliveira e São Paulo em 2019 e 2020, esse work analisa as reconfigurações da identidade druza no Brasil.
Sufismo transnacional en la Argentina contemporánea. Un registro etnográfico de la Orden Naqshbandi Rabbani situada en la Patagonia Argentina
Autoria: Cecilia Capovilla (Estudiante)
Autoria: Desde finales del siglo XIX, a partir de los procesos migratorios de sirios y libaneses, el Islam llega a Argentina y se institucionaliza como una religión étnica. A partir de entonces, atravesó diversos procesos de reconfiguración, encontrándose hacia fines de siglo XX, con la convivencia de variadas vertientes y la paulatina admisión de conversos sin ascendencia árabe musulmana. El sufismo, corriente esotérica del Islam, cuenta con antecedentes anteriores pero llega más ampliamente en los 90 al país a través de dos modos diferenciados de transnacionalización religiosa: una, vinculada a las estrategias de expansión hacia occidente, América Latina y Argentina de órdenes (Naqshbandiya y Yerrahia) con origen en Asia central y Turquía cuya membresía está formada exclusivamente por argentinos conversos; y otra, vinculada a procesos migratorios de africanos, donde las religiones (Mouridiya y Tijaniyya) “migran” junto a los devotos, reuniendo una membresía africana. En un sentido amplio, esta ponencia pretende dar cuenta del espacio que ocupa el sufismo en el campo religioso argentino. En sentido específico, el objetivo es describir la “Chacra del Recuerdo” perteneciente a la Orden Sufí Naqshbandi Rabbani, liderada por el Sheij Abdul Rauf Felpete, ubicada en un distrito rural de la Patagonia Argentina. A través de diversas visitas, las herramientas del método etnográfico, me permitieron introducirme al interior de la comunidad y generar un amplio registro narrativo y fotográfico de “la Mezquita más austral del mundo”, manera en la que la llamaba su maestro maestro Mawlana Sheikh Nazim, el líder global de la Orden Naqshbandi, fallecido en mayo de 2014 en Chipre. Al pie de la cordillera, desde hace más de 20 años, se asentó y comenzó a expandir esta orden, dando origen a una gran comunidad formada hoy día por más de 15 familias. En la chacra, además de la Mezquita y el Maqan, hay una dergah, con cabañas para hombre y mujeres, donde acuden alrededor de 60 personas para la realización del Diker y la Yumma, aprovechando muchos de ellos a alojarse todo el fin de semana para compartir diversas actividades con la comunidad.
“La resistência palestina es mujer y esta furiosa”
Autoria: Barbara Caramuru Teles (UFSC - Universidade Federal de Santa Catarina)
Autoria: Este work faz parte do projeto de tese, em andamento, que tem como tema as formas de palestinidades apresentadas América Latina, mais especificamente das cidades de Santiago, no Chile, e de Florianópolis, Brasil, que se revelam através de noções de pertencimento identitário, das organizações sociais e políticas locais e nas relações entre as sociedades de acolhida e os palestinos. Nesse sentido, proponho analisar dimensões desse “encontro” (Schiocchet, 2017) e suas implicações nos processos de reconhecimento identitário palestino. Especificamente nesse artigo trabalharei com uma situação etnográfia de Manifestações locais e das mulheres palestinas. “Israel es un macho violador” “La resistência palestina es mujer y esta furiosa”, “La lucha contra el sionismo es feminista”, “Contra la apropiación y colonizacion de los cuerpos y la tierra”, frases como estas estavam presentes nos protestos que aconteceram em Santiago, em 8 março de 2019. Novamente, as bandeiras feministas foram levantadas no dia 06 de dezembro de 2019, quando um grupo de feministas palestinas realizou um protesto em frente à embaixada de Israel na cidade de Santiago, entoando o “hino feminista” sobre o grito de ordem “Israel es um macho violador”. A performance feminista ficou conhecida nas manifestações por direitos sociais e mudanças governamentais no Chile, no mesmo ano. A letra do hino conhecido popularmente como “El violador eres tu” é uma crítica ao patriarcado, violência contra a mulher, feminicídio, a repressão e violência de gênero do Estado, da polícia (pacos e carabineros), juízes e inclusive do presidente (Piñera). Vestidas de preto, usando um kuffyeh preto e branco amarrado na cabeça, um grupo de mulheres, de maioria palestina, mas também chilenas adeptas da causa palestina, membras da organização política intitulada Union General de Estudiantes Palestinos, UGEP, realizaram a performance do hino cantado em árabe. Focando na construção da identidade pela alteridade, neste work problematizarei algumas formas como a palestinidade se apresenta em diferentes localidades, tomando como ponto de partida as trajetórias dos sujeitos para compreender a produção e operacionalidade dos gradientes de identidades e alteridades que revelam tais categorias.
El islam en Argentina: hallazgos a partir de un proyecto de preservación de la memoria institucional de una entidad histórica
Autoria: Miguel Leone (UNR - Universidad Nacional de Rosario), Miguel Leone
Autoria: Este poster presenta resultados parciales de un proyecto de investigación y extensión llevado a cabo por el Centro de Estudios sobre Diversidad Religiosa de la Universidad Nacional de Rosario. El mismo se enmarca en un convenio de cooperación académica y cultural entre dicha Universidad y la Asociación Unión Islámica de Rosario (creada en 1925, refundada en 1932). El acervo de la entidad consta de libros de actas, nóminas de socios de distintas épocas, correspondencia nacional e internacional, bibliotecas, inventarios y variados documentos, así como un acervo patrimonial edilicio y mobiliario. En esta comunicación haremos referencia a hallazgos del equipo de investigación a partir de las acciones de preservación del mencionado patrimonio institucional, los cuales contribuyen al conocimiento de: la inmigración islámica en la región, las relaciones nacionales e internacionales que las entidades musulmanas mantenían entre sí en America Latina desde los años `20, la configuración y vida institucional de entidades pioneras en el Cono Sur.