GT 72. Quilombos: dinâmicas territoriais, modos de vida, resistências e desafios antropológicos

Coordenador(es): 
Raquel Mombelli (NEPI)
Cintia Beatriz Muller (UFBA - Universidade Federal da Bahia)

A presente proposta é um convite do Comitê Quilombos ao debate crítico e avaliativo acerca da atuação dos agentes e instituições do Estado brasileiro que se seguiram a promulgação da Constituição Federal de 1988, no que diz respeito a regularização dos territórios das comunidades dos quilombos e de reconhecimento sociocultural, inclusão sociopolítica e de promoção da igualdade racial. Propõe-se analisar os retrocessos da política de demarcação e regularização das terras de quilombo e as implicações de sua atual paralisação promovida pelo atual Governo Federal, aos direitos quilombolas e à democracia étnico racial no país. Pretende-se ainda estimular a produção de três tipos de análise: 1º) o debate do ponto de vista dos quilombolas sobre suas lutas por direitos ao território, ao patrimônio cultural e às políticas públicas; 2º) a análise dos conflitos socioambientais deflagrados por grandes projetos nos territórios quilombolas; 3º) Avaliações críticas dos avanços a partir dos instrumentos legais e marcos regulatórios voltados à garantia dos direito;

Palavras chave: Quilombos; direitos; territórios
Resumos submetidos
"Se planejamento é papel, quando vamos pra prática? ”: Quilombolas de Linharinho (ES) e seus pontos de vista sobre os direitos ao território e as políticas públicas
Autoria: Renata Beatriz Rodrigues da Costa (UFES - Universidade Federal do Espírito Santo)
Autoria: Esta comunicação analisa, a partir de etnografia de uma reunião entre quilombolas da Comunidade de Linharinho e a municipalidade, os modos pelos quais o poder público se relaciona na figura de seus agentes com essa população. O objetivo é apresentar os discursos articulados pelos quilombolas para resistir e propor ações dentro do espaço público. A Comunidade Quilombola de Linharinho está localizada no norte do Espírito Santo na região do Sapê do Norte, no município de Conceição da Barra. Seu processo de reconhecimento pelo estado brasileiro começa com o relatório de identificação elaborado no ano de 2005. Há quinze anos a comunidade enfrenta na justiça contestações de uma multinacional de celulose e lida com a morosidade de decisões que afetam a vida de aproximadamente 36 famílias. O intuito aqui é apresentar pontos de vista da comunidade sobre o poder público trazendo assim a leitura que realizam das políticas de estado. O que se observa durante a reunião é uma espécie de “jogo de cena” que inclui vereadores e funcionários do município que recorrem a expedientes pouco objetivos para solucionar as demandas apresentadas. Os quilombolas e assentados se posicionam e buscam, por meio do conhecimento das políticas que detém e do uso de metáforas comuns aos jongueiros da região, desestabilizar e inverter o jogo de poder colocando-se como agentes em disputa. Durante cada tentativa de desconsiderar o que pleiteiam interpelam a municipalidade e propõem alternativas. A metáfora que permeia nossa análise é a do barco, tão comum à várias manifestações culturais negras no Brasil como os jongos e caxambus. A partir dela, uma das quilombolas que organizou a reunião interpela a municipalidade para falar dos modos de vida no quilombo antes e depois da retomada de suas práticas agrícolas. Assim, busca pôr em xeque os questionamentos sobre a validade dos assuntos levantados por seu grupo. Ao reunir argumentos para apresentar a agricultura como conquista diante do fim do work nos fornos de carvão, análogo à escravidão, o grupo busca possibilidades para não retornar ao work nos fornos que é, como dizem em Linharinho: “maldição”. E contrapõe pela ação a ideia tão cara ao processo de construção do cidadão afro-brasileiro como sujeito débil apresentando-se como sujeito integrante dentro de um estado multiétnico e diverso.
A antiga Casa-Grande da Fazenda Taperinha (Santarém, PA): entraves na luta quilombola de Patos do Ituqui por um patrimônio cultural
Autoria: Marcos Antonio Silva dos Santos (nenhum)
Autoria: O quilombo Patos do Ituqui, localizado na cidade de Santarém (PA), tem resistido aos ataques de fazendeiros de gado da região interessados nas terras que a comunidade ocupa tradicionalmente desde 1911, segundo a memória social do grupo. Em meio ao conflito socioambiental deflagrado por disputas entre Patos do Ituqui e os fazendeiros de gado pelo acesso a recursos ambientais, ao longo do processo de regularização fundiária do quilombo iniciado em 2013 surge também a reivindicação dos quilombolas pelo reconhecimento da antiga Casa-Grande da Fazenda Taperinha como um patrimônio cultural do quilombo. De acordo com a bibliografia utilizada neste artigo, a Fazenda Taperinha pertenceu a Antônio Pinto Guimarães, o Barão de Santarém, que tornou esse Engenho o maior do Baixo Amazonas após estabelecer uma sociedade com o ex-confederado Rhomulus Rhome, um dos norte-americanos que por volta de 1867 imigraram para o Brasil incentivados por uma política de concessão de terras estabelecida pela província do Grão-Pará. A partir de uma etnografia documental do processo 54501.002737/2013, que trata da regularização fundiária do quilombo, e de pesquisa de campo em junho de 2018 e outubro de 2019 na comunidade supracitada, este work tem por objetivo geral analisar a antiga Casa-Grande da Fazenda Taperinha por uma reflexão de “museu quilombola” (ALMEIDA, 2018), que foi uma perspectiva de análise de acordo com o ponto de vista dos quilombolas de Patos do Ituqui sobre a sua luta pelo reconhecimento de um patrimônio cultural que deve ser construído e mantido em termos de comunidade. Desta forma, neste estudo destacou-se que a antiga Casa-Grande da Fazenda Taperinha é utilizada pelos quilombolas de Patos do Ituqui como critério de ancialidade, um dos quais orienta as ações de reivindicação de direitos do grupo ao longo do processo de regularização fundiária, que é protelado há mais de cinco anos no interior do aparato estatal brasileiro. Nesse ponto, uma questão se levanta: onde está o poder de decisão sobre o que é relevante para a comunidade tradicional e o que deve ser “preservado” como uma memória histórica do grupo? Com auxílio das teorias de “museu quilombola” percebeu-se que tal questão é deslocada do aparato do Estado por agência do grupo para o interior da organização social da comunidade que reivindica o reconhecimento daquilo que ela entende como seu patrimônio cultural, que deve existir intencionado no auxílio a construção da identidade quilombola no presente em referência ao passado do grupo a partir de materialidades, símbolos e memórias “tornadas coleções”.
A desigualdade como projeto: Os programas de desenvolvimento econômico e os quilombos no Espírito Santo
Autoria: Sandro José da Silva (UFES - Universidade Federal do Espírito Santo)
Autoria: A comunicação é parte do projeto "Africanidades Transatlânticas", desenvolvido com recursos da Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Espírito Santo (FAPES) e expertise da Universidade Federal do Espírito Santo para desenhar novas linhas de financiamento e pesquisa sobre o tema das desigualdades que afetam os afrodescendentes. Um dos objetivos tratados na presente comunicação é traçar um panorama das condições da reprodução das desigualdades socioeconômicas que afetam os quilombolas no Pós-Abolição. Para isso privilegiou-se dois contextos de projetos de desenvolvimento econômico envolvendo quilombos no estado do Espírito Santo. Em Degredo, município de Linhares, os quilombolas buscam se reorganizar politicamente para atender aos quesitos do Termo de Ajuste de Conduta em face do desastre no Rio Doce, ocorrido há 4 anos, na Bacia do Rio Doce, e que afetou de forma drástica seu modo de vida. Em Linharinho, município de Conceição da Barra, os quilombolas buscam formas de se fazer ouvir no processo de asfaltamento da rodovia que atravessa seu território e que já dura mais de oito anos. Nos dois casos serão descritas, em primeiro lugar, a pertinência das identificações étnicas quilombolas em relação aos diferentes agentes públicos e privados, especialmente em face das estratégias de enfrentamento do Racismo e, em segundo, as diferentes estratégias da necropolítica desses agentes como práticas divisantes. Embora os dois casos mostrem dinâmicas distintas, o que está em jogo nos resultados da pesquisa aponta para as extremidades nas quais o racismo opera sua reprodução de práticas hierarquizantes.
A questão Agrária em território quilombola: narrativas, lutas e resistências na comunidade Santarém no município de São Luís Gonzaga do Maranhão
Autoria: Francisca Gárdina dos Santos Lima (Fundação Grupo Esquel)
Autoria: O debate sobre questão agrária no Brasil tem se desenvolvido em torno de duas compreensões. Uma dessas pressupõe a existência da atividade agrícola empresarial, com aumento da produção e da produtividade a concentração de terras nas mãos de uma minoria não configuraria um problema agrário. A outra contrapõe-se à primeira, a forma como está organizado o sistema de uso, posse e propriedade da terra tem intensificado os conflitos agrários gerando problemas sociais, políticos e ambientais. O modelo de exploração da terra dominante no país opera numa lógica que invade, expropria e devasta territórios tradicionalmente ocupados, como comunidades quilombolas e terras indígenas. O Maranhão não escapa a essa lógica, uma vez reúne em seu território condições propícias para essa perspectiva desenvolvimentista. A região do Médio Mearim ocupada desde meados do século passado por pessoas oriundas de estados do Nordeste que em sua trajetória, aprenderam a “desbravar matas” e a sobreviver de uma economia de base familiar. Posteriormente, diante das investidas de latifundiários, a região passou por fortes conflitos, principalmente na década de 1980, havendo a resistência de centenas de famílias camponesas que lutaram e lutam pelo livre acesso aos babaçuais e contra a concentração da propriedade da terra. S. L. Gonzaga, pertencente à essa região, insere-se na mesma lógica, caracterizando-se como um território de conflitos por terra que envolvem sobretudo, comunidades quilombolas.
Comunidades Quilombolas do Alto Trombetas II e Unidades de Conservação: sobreposição de interesses, desafios e conciliação de direitos
Autoria: Raiana Siqueira Mendes (UFPA - Universidade Federal do Pará), Luciana Gonçalves de Carvalho
Autoria: Em fevereiro de 2017, após a publicação do Relatório Técnico de Identificação e Delimitação do Território Quilombola Alto Trombetas II - localizado na Região de Trombetas/PA, foi dado início a um ciclo de reuniões na tentativa de resolver o conflito que já estava instalado. As comunidades quilombolas reivindicavam a titulação do território imediatamente, mas isso não era possível porque há uma sobreposição territorial com duas Unidades de Conservação (UCs) – Floresta Nacional Saracá-Taquera (Flona) e Reserva Biológica do Rio Trombetas (Rebio), ambas gerenciadas pelo Instituto Chico Mendes de Conservação e Biodiversidade (ICMBio). O título só poderia ser dado definitivamente se as unidades fossem desafetadas, porém este não seria um processo simples. No caso, necessitaria de um Projeto de Lei (PL) e de todos os trâmites para ser aprovado, e provavelmente o conflito se arrastaria por mais tempo. Ainda, se o tal PL fosse aprovado, na atual conjuntura política do Brasil, não haveria garantia que a posse da terra fosse destinada aos quilombolas. Depois de muitas discussões e avaliações, os quilombolas compreenderam que esta não seria a melhor a saída e deliberaram por aceitar a oferta do ICMBio, pelo menos temporariamente. A oferta consiste em estabelecer um Contrato de Concessão de Direito Real de Uso (CCDRU) para a área da Flona e um Termo de Compromisso para a área da Rebio. Com esse acordo, ocorreu a publicação da Portaria de Reconhecimento do Território, em julho de 2018, considerada uma grande vitória pelos quilombolas, um avanço na resolução do conflito. Todavia o acordo não encerrou as tratativas para a expedição do título de terra definitivo, e os quilombolas, representados pela Associação das Comunidades Remanescentes de Quilombo do Alto Trombetas II (ACRQAT), seguirão a luta para a consolidação desta pauta histórica. Todas as deliberações que levaram ao acordo foram engendradas em intensas reuniões, que exigiram um convívio entre membros do governo e da associação quilombola jamais visto antes. Essa aproximação também pressupôs a necessidade da criação de um “diálogo” - assim chamado pelos quilombolas e representantes do governo. O “diálogo”, para o grupo que esteve à frente da condução do processo, era considerado indispensável para se chegar a encaminhamentos que fossem aprovados por todos os interessados. Diante do exposto, o objetivo deste work, iniciado no curso de graduação em Antropologia da Ufopa, é refletir de maneira mais aprofundada o “diálogo” enquanto categoria nativa e, na medida do possível, como categoria analítica. Indago: Em que consiste o diálogo? As características do processo de negociação sobre a regularização fundiária do território são, efetivamente, dialógicas?
De “neguinha do Riacho” a “Quilombola”: redes, dinâmicas e estratégias de luta por direitos a partir da cultura no Quilombo Riacho dos Negros no Piauí.
Autoria: Ariane Couto Costa (zanettini Arqueologia)
Autoria: Numa cidade cujo mito fundador versa sobre a incompatibilidade de ocupação territorial por negros e brancos, as comunidades negras que formam o Quilombo Riacho dos Negros, em São João do Piauí, agenciam essa segregação em seu favor, como forma de manter seus arranjos sociais e modos de vida, marcadamente rurais, que possibilitam ainda a continuidade de práticas culturais através de gerações. Através de uma solicitação do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), três práticas culturais locais das comunidades, entendidas pelo órgão como “Bens Culturais”, foram objeto de “documentação” etnográfica por nossa equipe: A Capoeira, os Batuques e os Terreiros. Realizadas por diversos grupos nas comunidades quilombolas do Território, essas práticas tanto os marcam racialmente como os “negros do Riacho”, produzindo desigualdade; quanto se tornam armas de luta para a construção da identidade Quilombola que foi necessária ao reconhecimento do TQ. São estratégias de luta impulsionadas por outro mestre Quilombola, Antônio Bispo dos Santos, que passam a ser agenciadas pelos locais das mais diversas formas. O que pretendemos discutir neste artigo é como as lideranças relacionadas a esses três “Bens Culturais”, manejando as categorias jurídicas de “cultura” e a própria categoria “negro”, se articulam em redes entre si, criando dinâmicas; como elas buscam estratégias de diálogo e reivindicação por território, por direitos básicos e por seu direito cultural à fruição de suas práticas.
Disputas, resistência e direitos territoriais: uma análise sobre o território quilombola de Alto Alegre, Horizonte – CE
Autoria: Antonio Jeovane da Silva Ferreira (UNILAB - Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira)
Autoria: A comunidade de Alto Alegre, localizada no município de Horizonte, região metropolitana de Fortaleza, é uma das 87 comunidades remanescentes quilombolas no Estado do Ceará. Sua gênese e trajetória histórica, conferida por Negro Cazuza, africano e ex-cativo e uma indígena da etnia Paiacu, remontam, de um lado, a luta do povo negro contra a escravidão e, de outro, a sua (re)atualização que realça, contemporaneamente, um movimento de reivindicação identitária e territorial. Desde seu reconhecimento pela Fundação Cultural Palmares em meados de 2005, diferentes estratégias têm sido articuladas para o fortalecimento da identidade quilombola, concomitantemente a luta em defesa da demarcação e titularização de seu território ancestral, o que tem sido pauta chave para sua organização política, nascida em meio às tensões históricas. Neste bojo, este tem sido um território disputado por diferentes segmentos, desde os agentes político-econômicos da região em que está inserido, pelo impacto advindo pelos empreendimentos hídricos partidos do governo estadual, pela vertiginosa expansão da industrialização no município de Horizonte e também pelos conflitos na relação com os “outsiders” e/ou os “diferenciados”, portanto, os “de fora”. Diante dessa conjuntura onde há a atuação direta de diferentes forças e ainda sob um olhar antropológico, o presente work visa discutir os impactos destas disputas sobre a identidade e o território quilombola e realçar ainda as estratégias de luta e resistência frente às forças hegemônicas atuantes.
Educação escolar quilombola em Santa Catarina: desafios e perspectivas
Autoria: Raquel Mombelli (NEPI)
Autoria: Apresenta e discute o processo de implementação da Política de Educação Escolar Quilombola em Santa Catarina, Brasil. Após longo processo judicial, em 2016 um seminário reunindo professores das comunidades quilombolas, representantes do Movimento Negro Unificado de Santa Catarina (MNU/SC) e técnicos da Secretaria Estadual de Educação/SED, pactuou suas principais diretrizes. Este esforço resultou na publicação do Caderno de Política de Educação Escolar Quilombola, compondo as políticas das Diversidade da Secretaria de Estado da Educação de Santa Catarina. Sabe-se que o tema quilombola é algo relativamente novo em termos de políticas públicas no Brasil e a situação tem revelado os múltiplos processos de exclusão educacional e de preconceito vivenciado por estes grupos sociais. Esta comunicação apresenta a experiência de atuação da autora como consultora do Caderno, analisa as dificuldades da implementação desta política, que envolvem desde questões relacionadas à organização administrativa e estrutural especificas até a carência de investimentos em cursos de formação para professores e técnicos voltados a desconstruir estereótipos e visões ultrapassadas da noção de quilombo, entre outros desafios.
Em busca da singularidade: a construção de um currículo diferenciado em uma escola quilombola
Autoria: David Gonçalves Soares (UFF - Universidade Federal Fluminense), Antônio Jorge Gonçalves Soares Kalyla Maroun
Autoria: A literatura sobre educação escolar quilombola tem demonstrado inúmeras imprecisões desta categoria. Do ponto de vista analítico, como descreve Arruti (2017):“a educação escolar quilombola não é nem uma realidade da qual possamos propor um retrato preciso, nem uma proposta pedagógica específica ou uma política pública definida”. Para Maroun e Carvalho (2017), que analisaram duas escolas quilombolas, as experiências de educação escolar quilombola podem se mostrar tão distintas quanto o processo de formação e autoatribuição das próprias comunidades. Se a realidade tem sugerido que as experiências educacionais quilombolas são múltiplas, todavia deve-se perguntar: que características e mecanismos gerais encontramos na construção dessa educação diferenciada que a distingue da educação convencional? Como avaliar seus efeitos, tanto para a luta quilombola, como para a escolarização das crianças e adolescentes quilombolas e não-quilombolas que frequentam a mesma escola? Com base nestas questões o work descreve o processo de construção de um currículo quilombola – seus atores, significados, valores e dilemas que enfrenta - em um estudo de caso na Escola Municipal Quilombola Dona Rosa Geralda, município de São Pedro Aldeia –RJ. A construção dessa escola atendeu a uma antiga demanda da comunidade Botafogo-Caveira, ainda anterior ao reconhecimento formal das comunidades de remanescentes, inaugurado com a Constituição de 88. Foi somente em 2013, com a comunidade já certificada como remanescente, que a escola passa a ser finalmente ofertada. Segundo nossas observações, a escola vem desde então congregando novos significados para seus membros, tanto em relação ao currículo escolar quanto à luta pela melhoria de suas condições e regularização de suas terras. A construção de seu currículo parece representar um significativo ponto de convergência para a construção de uma nova cultura e tradição quilombola local. Parte da literatura tem demonstrado como danças e festas têm sido (re)construídas para fortalecer a etnicidade e promover a coesão cultural e social desses grupos (Maroun, 2016; Lara et. al.,2009; Arruti, 1997). Neste estudo de caso, analisamos como a escola vem ocupando um espaço privilegiado para o desenvolvimento da (re)construção étnica da comunidade, ao mesmo tempo que esbarra em tensões e limites pela intersecção desse sentido com as funções precípuas da escolarização básica. Pois, no caso da educação diferenciada quilombola, a relação comunidade-escola ganha novos contornos na medida em que inverte a função típico-ideal do modelo de escola republicana, a de valorização de um conjunto de valores e de princípios não grupais e percebidos como universais (Dubet, 2011), pela revalorização e afirmação de identidades diferenciadas e localistas.
Expressões do movimento quilombola na comunidade de Limoeiro (Palmares do Sul/RS)
Autoria: Mônica de Andrade Arnt (EMATER), ALMEIDA, Luciana Schleder (UNILAB)
Autoria: Em 2004, a localidade de Limoeiro, localizada no litoral do Rio Grande do Sul, foi reconhecida pela Fundação Palmares como comunidade quilombola. Desde então, as políticas quilombolas vêm ocasionado efeitos sociais importantes, relacionados à construção de campos de mediação que viabilizem a inserção desses novos sujeitos de direitos nas instâncias de participação política. Estas instâncias produzem sistemas cognitivos, de circulação de categorias de entendimento e de enquadramento de sentidos diversos. Quase vinte anos depois, a conjuntura política que favoreceu a emergência dos “quilombolas” encontra-se modificada e menos favorável à mobilização. Este work, de caráter inicial, tem por objetivo reconstituir o processo de mobilização que redundou na constituição da associação quilombola de modo a revelar as mudanças que vêm ocorrendo na forma de participação nas arenas de mediação política e cultural instituídas pelas políticas quilombolas. O objetivo do work é apresentar um conjunto de dados etnográficos que revelem o estado atual do movimento quilombola na comunidade, sobretudo seu repertório de ações coletivas e as condições de emergência de novas lideranças locais. A exploração dessas questões permitirá também captar o significado local atribuído a essa nova definição de coletivo “quilombola”.
Memórias e tradições culturais: demarcadores de identidades e de territórios quilombolas no Espírito Santo
Autoria: Osvaldo Martins de Oliveira (UFES - Universidade Federal do Espírito Santo)
Autoria: Este artigo tem por objetivo analisar as memórias das chamadas “tradições” culturais a partir das narrativas de vida e trajetórias de lideranças e mestres de saberes tradicionais de comunidades quilombolas. A partir do ponto de vista de tais lideranças e mestres, a presente proposta de artigo analisará também suas demandas por direitos étnicos ao território, ao patrimônio cultural e às políticas públicas de titulação das terras dos quilombos e de reconhecimento e salvaguarda do patrimônio cultural. Os dados a serem analisados são provenientes do projeto de pesquisa que atualmente coordeno - o “Africanidades transatlânticas: cultura, história e memórias afro-brasileiras a partir do Espírito Santo” – onde, em termos metodológicos, foram realizadas entrevistas, participação e observação em eventos organizados por esses mestres e lideranças, como nos denominados “bailes de congos de São Benedito”, “rodas de jongo” e “bandas de congo” (ou simplesmente congo). A partir da análise dos dados, é possível apresentar a síntese de quatro resultados conclusivos preliminares de diferentes dimensões desses eventos festivos tradicionais quilombolas e de suas memórias, a saber: 1º) As memórias de mestres e lideranças remetem aos antigos e novos lugares de realização de eventos festivos em territórios de quilombos no Estado do Espírito Santo, que aqui são analisados como lugares de memórias, de práticas e tradições culturais; 2ª) As lembranças de lugares/territórios do passado, bem como das tradições culturais praticadas nesses lugares, são acionadas como elementos demarcadores do pertencimento às comunidades quilombolas e aos seus territórios, configurando-se como símbolos de identificação étnica; 3ª) Os eventos festivos podem ser considerados momentos importantes para rever amigos e parentes, bem como para estabelecer e consolidar laços de parentesco, pois neles tem ocorrido acordos de alianças matrimonias entre os futuros cônjuges e suas famílias; 4ª) Nos eventos festivos, sobretudo aqueles dedicados a São Benedito, ocorrem discursos políticos de denúncia de expropriação dos territórios quilombolas, dos descasos das autoridades políticas e governamentais em relação à saúde, à educação e à geração de emprego, não apenas aos quilombolas, mas a todos os brasileiros. Caso a proposta seja aceita, a descrição e análise mais detalhadas dos dados serão apresentadas no artigo final a ser publicado nos anais da 32ª RBA.
Modos de fazer política no quilombo: experiências de comunidade nas tensões entre univocalidade, representação e multiplicidade
Autoria: Lúnia Costa Dias (UF)
Autoria: Esta proposta enseja reflexões em torno dos modos de fazer política da comunidade quilombola de Pinhões (localizada no estado de Minas Gerais – Brasil) e os constructos da identidade quilombola em seus múltiplos alcances e formas. As bases para o desenvolvimento das reflexões se fazem a partir das angústias advindas dos contrastes e fissuras observados e pautados pelos quilombolas a partir de suas relações com esferas de reconhecimento, principalmente equipamentos do estado brasileiro. A angústia central apresentada se refere, segundo apontaram os próprios quilombolas, a uma certa exigência de coerência e unicidade discursiva e prática de organização política. Tal angústia, que é em si constituinte do processo de construção/afirmação de identidades étnicas, eclodiu, na comunidade quilombola de Pinhões, num forte processo reflexivo sobre as condições operantes de constituição da própria comunidade, saltando aos olhos como uma dimensão claramente operada pela multiplicidade, e que enquanto tal, na relação com o estado (principalmente) necessitaria, até certo ponto, de mecanismos de controle e produção de unicidade/univocalidade. Nestes termos pretendemos trazer para a análise a noção de comunidade como sustentáculo da resistência e da autonomia em relação a mecanismos estruturantes de dominação operados na chave da produção de homogeneidade, univocalidade e representação, tensionando distintos modos de agência e prática política. Problematizando, assim, os desafios dos modos de organização política exigidos pelos processos de reconhecimento e da implementação das políticas públicas destinadas às comunidade quilombolas e os desafios postos pelo atual contexto político do estado em suas distintas esferas – federal, estadual e municipal – e a produção do conhecimento antropológico junto às comunidades. Almejamos, assim, a partir das reflexões advindas dos works desenvolvidos junto ao Quilombo de Pinhões, permeadas e perpassadas por diferentes angustias, que, digamos nos atravessam de modos e escalas distintos; buscando contribuir, assim, para os objetivos expressos neste Grupo de work.
Narrativas coloniais em torno do work doméstico no Quilombo do Paredão Baixo, Taquara – RS: uma análise etnográfica
Autoria: Lucilene Guimarães Athaide (Jornal NH)
Autoria: O círculo de marginalização que se formou no pós-abolição para a população negra brasileira afrodiaspórica é um fator constantemente abordado nos estudos que abrangem as ciências sociais. Um resquício desta condição de subalternidade é evidenciado no mercado de work, onde ainda são as mulheres negras que ocupam os postos considerados mais baixos dentro da hierarquia social. Desta forma, a pesquisa busca a partir das vivências das moradoras da comunidade quilombola do Paredão Baixo, localizada no município de Taquara, no interior do estado do Rio Grande do Sul, discutir a relação das mesmas com este mercado e persegue o objetivo de entender de que maneira a função de faxineiras, exercida pela maioria das mulheres deste local, produz sentido dentro do contexto em que elas estão inseridas. Entender a relação destas mulheres com o work que exercem através de seus relatos autobiográficos se torna relevante na medida em que retoma a pertinente discussão sobre população negra, com ênfase no gênero, e a histórica relação com a ocupação dos postos de servidão. O estudo, que faz parte da construção de uma dissertação de mestrado, a ser defendida no início do próximo ano, adota como estratégia metodológica a etnografia, com a utilização de observação participante. A pesquisa exploratória parece indicar que as interlocutoras, mesmo estando em posição subalterna em relação às famílias abastadas dos lugares em que trabalham, ocupam dentro da comunidade quilombola o status de protagonismo para com os seus pares. Seguindo assim a continuidade de um sistema matriarcal de liderança no quilombo onde nasceram.
O Disucso do Progresso, o Racismo e a Entregada da Base de Alcântara: implicações do Acordo de Salvaguarda Tecnologico - AST para o Territorio Etnico Alcântara.
Autoria: Davi Pereira Junior (UT)
Autoria: A assinatura do acordo de salvaguarda tecnologico (AST) entre os gorvernos brasileiro e americano em março de 2019 reacendeu o debate sobre a possibilidade de novos deslocamentos compulsorios em Alcântara para poder possibilitar dita consolidacao do programa especial brasileiro atraves da implamentação do Centro Espacial de Alcântara - CEA. O ensaio vai versa sobre as implicações da AST para as Comunidades quilombolas de Alcântara bem como; a ameaça de novos deslocamentgos compulsorios de centenas de familias, a impossibilidade de acesso ao litoral pelos quilombolas, além da redução do territorio etnico. O ensaio pretende abordar as estratergias de Resistencia e mobilização usadas pelas Comunidades e movimentos sociais de Alcântara. O ensaio também vai analisar o as posições assumidas pelo governo e parlamentares Maranhense, assim como a posição do estado brasileiros e instituições tais como MPF e DPU. Em ultimas analise o ensaio abordara a logica racista na qual o processo da AST foi construido.
Os antropólogos e a identificação de terras quilombolas no Brasil (1997-2015)
Autoria: Ana Paula Comin de Carvalho (UFRB - Universidade Federal do Recôncavo da Bahia)
Autoria: Este work tem como tema as práticas e relações entre a antropologia brasileira e a identificação das terras das comunidades remanescentes de quilombos. O direito coletivo à terra para as comunidades negras rurais e urbanas de nosso país não foi baseado num acúmulo de estudos antropológicos sobre essa população, como no caso colombiano. Foi o imaginário sobre o que teriam sido os quilombos que alcançou o estatuto de tema constitucional em 1988. Desse modo, o problema de identificação desses grupos configurou-se num campo específico de atuação que envolve uma gama diversificada de mediadores,. Dentre eles, os antropólogos que entre os anos de 1997 e 2015 produziram 209 relatórios de identificação de territórios quilombolas. Diante da inexistência de um balanço sobre esses works, buscamos preencher essa lacuna a partir da análise de uma amostra desse universo com ênfase nas estratégias de construção de autoridade etnográfica, na política de citações e na narrativa implícita que estruturam os relatórios em questão.
Os Guardiões da Cultura: os desafios da produção e transmissão da cultura tradicional afro-brasileira pelos Mestres do Ticumbi do Bongado.
Autoria: Luciana Cruz Carneiro (UFES - Universidade Federal do Espírito Santo), Aissa Afonso Guimarães
Autoria: Sabemos que a discussão sobre culturas tradicionais e seus mestres se faz necessária uma vez que possui forte conteúdo simbólico que representam etnias, grupos sociais e nações; desta forma por meio das trajetórias de três Mestres junto ao Baile de Congos de São Benedito do Bongado e suas respectivas ações de preservação da memória cultural e transmissão de saberes, discutiremos os percursos e desafios enfrentados por eles nesta prática, que resiste há mais de dois séculos em Itaúnas, distrito da cidade de Conceição da Barra/ES. Analisaremos ações públicas existentes no estado do Espírito Santo direcionadas aos saberes locais, seus alcances e lacunas na promoção dos conhecimentos e fortalecimento de expressões culturais. Para esta análise usaremos autores que discutem questões relacionadas às políticas de patrimônio no Brasil como Regina Abreu, José Reginaldo Santos Gonçalves, Maria Cecília Londres Fonseca dentre outros. Há tempos são crescentes as preocupações com o desaparecimento de alguns modos de fazer, como tradições de artesanatos, formas de organização, entre outros saberes; mediante esta preocupação e a fim de garantir às novas gerações a transmissão desses saberes, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) propõe a criação em todo mundo de um programa de valorização dos mestres em diferentes ofícios intitulado “Tesouros Humanos Vivos” a fim de garantir-lhes condições para a realização da transmissão. No estado do ES ações como a premiação de Mestres por suas atuações como transmissores da cultura, estão sendo realizadas através da Lei Complementar Estatual nº 458/8, que instituí o Fundo de Cultura do Estado do Espírito Santo – FUNCULTURA que os reconhece através de certificação de “Mestres das Culturas Populares do Estado do Espírito Santo” e ou de “Reconhecimento pela Manutenção das Culturas Populares e Tradicionais do Estado do Espírito Santo”. Outras ações realizadas por meio de parceria entre algumas prefeituras, escolas e detentores; também garantem a continuidade do saber através do conhecimento dos mestres. Contudo, sabemos que há lacunas no acesso a estas ações, e questões a serem discutidas como condições básicas de sobrevivência dos Mestres, o acesso à saúde, à remuneração pelo work cultural e outros. O valor à cultura se dá através da valorização e cuidado com os que detêm o conhecimento e os transmitem. É fundamental pensarmos em ações que contribuam para que nossos guardiões tenham acima de tudo, qualidade de vida para darem continuidade a transmissão dos saberes. Este artigo visa contribuir com os debates sobre a importância do reconhecimento, proteção e valorização dos conhecimentos e fazeres das culturas tradicionais afro-brasileiras.
Quilombo de Palmas: demarcação, tensão e resistência
Autoria: Francine Nunes Ávila (FEEVALE - Universidade Feevale), NUNES, Margarete Fagundes.
Autoria: A Constituição Federal de 1988 garantiu aos remanescentes das comunidades de quilombos que estejam ocupando suas terras o reconhecimento da propriedade definitiva, atribuindo ao Estado a função da emissão dos títulos de propriedade. O reconhecimento constitucional dos direitos dos quilombolas historicamente reprimidos e esquecidos foi um marco importante para concepção de sujeitos detentores de direitos, os quais decorrem das suas características históricas, étnicas e vivências exclusivas daquelas comunidades. Apesar da atribuição de direitos formais aos descendentes de quilombos, tais sujeitos de direito ainda encontram um distanciamento entre as previsões da legislação e a realidade social. O presente resumo tem como objetivo estudar o processo demarcatório do Quilombo de Palmas, localizado na região da campanha do Rio Grande do Sul, o qual teve seu reconhecimento definitivo em fevereiro de 2017, através de um conturbado processo de demarcação, permeado por ações judiciais envolvendo Associações de Produtores Rurais da Região, violências, ameaças, necessidade de ação da Polícia Federal para permitir o work dos antropólogos, chamando atenção especialmente o fato de alguns quilombolas são contrários ao reconhecimento dos seus direito. As razões que levam a essa negação de direitos são o objeto da pesquisa, que também busca entenderem a polarização dentro e fora do quilombo e a tensão gerada pela luta pelo reconhecimento, analisando a implementação prática da proteção e reconhecimento das comunidades quilombolas promovida pelo texto constitucional no que diz respeito ao reconhecimento da propriedade aos descendentes de quilombos, a demarcação das terras e seus processos. O tema trata-se de pauta atual e pertinente, sobretudo em um momento em que os quilombolas são discriminados diuturnamente no que diz respeito às políticas públicas e reconhecimento de direitos, ficando cada vez mais em situação de vulnerabilidade e invisibilidade. O método de pesquisa utilizado é o etnográfico, adotando como técnicas de pesquisa o diário de campo, observação participante e entrevistas não-diretivas e etnografia de acervo, através do estudo dos processos judiciais promovidos em decorrência do procedimento demarcatório.
Quilombos Contemporâneos na Baía de Todos os Santos: sobreposições territoriais e grandes empreendimentos
Autoria: Cintia Beatriz Muller (UFBA - Universidade Federal da Bahia), Edmundo Fonseca Machado Junior
Autoria: A Baía de Todos os Santos, BA (BTS/BA), possui ocupação antiga. Com margens densamente povoadas, desde o período escravista, reúne, hoje em dia, um número significativo de quilombos contemporâneos. As suas margens encontramos, também, uma significativa profusão de empreendimentos instalados, cada qual de acordo com políticas específicas relacionadas a interesses financeiros de elites nacionais e transnacionais. Assim, a partir de dados de pesquisas realizadas na região desde 2014 produzimos uma análise acerca da relação entre sobreposições territoriais e grandes empreendimentos em dois locais de pesquisa: São Francisco do Paraguaçu, Cachoeira/BA, e Porto Dom João, São Francisco do Conde/BA.
Resistência e territorialidade / Comunidade Remanescente do Quilombo da Tapera
Autoria: Rachel de Las Casas (Iterj)
Autoria: As tentativas de remoção da comunidade remanescente do quilombo da Tapera, localizada em Petrópolis (RJ), os chamados processos de desterritorialização, impulsionaram e fortaleceram seus movimentos de resistência local e luta por direitos. A ancestralidade negra destes grupos de família marca o território com a sua própria maneira de executar seu processo de resistência à opressão histórica sofrida. Tapera é um território étnico no qual a ordenação do espaço é estruturada por densos laços de parentesco, de matriz endogâmica. As especificidades étnicas desta comunidade tradicional delimitam suas fronteiras fundiárias. E muito mais que valor no mercado imobiliário regional, aquele território estrutural carrega o sentido de perpetuação do modo de vida diferenciado dos grupos de família que ali residem há, no mínimo, seis gerações de parentesco, justamente pela possibilidade de transmissão das correntes de tradições culturais que estruturam seu modo de vida naquele território específico. Esses grupos de família, os André, Casciano, Bello e Fiel, enfrentaram a opressão da especulação imobiliária da região envolvente ao seu território tradicional com um processo de resistência estruturado no afastamento da fronteira intersocietária e no fortalecimento dos seus laços de reciprocidade. A ancestralidade que marca este processo de resistência, assim como as especifidades na relação com o meio envolvente, explicitam os diferenciais de um processo de regularização fundiária de um território de uma comunidade remanescente de quilombo.
Ser bem recebido e mais bem tratado: As modulações da categoria receptividade no quilombo Malhadinha com a chegada de uma linha de transmissão de energia
Autoria: Daniella Santos Alves (Professor)
Autoria: A presente comunicação é fruto da imersão etnográfica a qual venho desenvolvendo, desde o começo de 2019, na comunidade de remanescentes quilombolas Malhadinha, situada no estado do Tocantins (TO). Em 2005 a comunidade foi reconhecida como remanescente de quilombo e, a partir daí, segundo os moradores, as mudanças começaram a acontecer. Uma das principais transformações é que, agora, e diferente do passado, várias pessoas demonstram interesse no grupo. Pesquisadores da UFT e de outros estados, curiosos, “ex-parentes”, missionários, agentes do estado do Tocantins, de programas do Governo Federal – como o Brasil Quilombola –, prefeituras, escolas e faculdades, todos estes chegam até os integrantes da comunidade não só com diversos projetos, mas inquietações e perguntas. A chegada dos de fora é bastante diversa e ao inquirir os moradores do porque estes preferem a Malhadinha em detrimento de outras comunidades da região, a resposta é ligeira – somos um povo receptivo. A receptividade deve ser aqui compreendida como própria da Malhadinha, ou seja, sempre existiu nas suas relações internas. Logo, receber bem, é oferecer o que se tem de melhor em casa, é doar alguma fruta, verdura, uma carne de caça ou boi, é deixar as portas abertas, é dar farinha e até mesmo rapadura. O desafio é entender como uma prática da comunidade passa não só a receber os elementos de fora, mas modela criativamente as recepções conforme os agentes e os interesses aí colocados. Dentre as várias frentes relacionais, o work pretende focar na figura dos de fora através do empreendimento bilionário de energia elétrica que impactou o território do grupo a partir da construção de torres de energia. Vale ressaltar que a empresa não procurou a comunidade por ser a Malhadinha, mas sim, como uma resposta aos imperativos legais do processo de Licenciamento Ambiental. Entretanto, os moradores, acostumados com a chegada de vários elementos externos, passam a receber bem os representantes do empreendimento não só como um mecanismo de controle, mas também, como um elo de negociação. Isto é, durante as conversas para alcançar um consenso sobre as benfeitorias mitigatórias, estes, acabam por colocar seus interesses através da arte de receber bem. Logo, a receptividade é o fazer política da Malhadinha.
“VIVEMOS NUM CORREDOR DA MORTE”: Projetos de infraestrutura, conflitos socioambientais e resistências em territórios quilombolas, na região dos campos naturais - MA.
Autoria: Tacilvan Silva Alves (UEMA - Universidade Estadual do Maranhão), Emmanuel de Almeida Farias Júnior
Autoria: O texto ora apresentado versa sobre uma série de projetos de infraestrutura e logística implantados sobre distintos territórios quilombolas, na região dos campos naturais de Bacabeiras, Santa Rita, Itapecuru Mirim e Anajatuba. Todos esses megaprojetos têm ocasionado efeitos sociais complexos na vida de agricultores familiares, quebradeiras de coco babaçu, pescadores artesanais, indígenas e quilombolas. Tais efeitos referem-se a destruição de cursos d’água, supressão florestal, acidentes nas rodovias e ferrovias ocasionando a morte de pessoas, a morte de animais silvestres e domésticos. Contudo podemos pensar esses efeitos sociais a partir de uma nova ótica, a qual José Sérgio Leite Lopes denominou de ambientalização dos conflitos sociais, o seja, a reivindicação de equidade ambiental passa a compor o repertório das reivindicações dos movimentos sociais. As discussões levantadas aqui decorrem de atividades de cartografia social com os quilombolas do município de Santa Rita durante 2019. estas iniciativas de cartografia social nos permitiu nos permitiu anotar dados específicos desses conflitos socioambientais, iniciados em 2017, com o acirramento ocasionado pelo inicio da duplicação da BR-135, marcada pela ausência de debates entre os órgãos responsáveis e as comunidades desses territórios no que tange aos processos de consulta previa conforme a Convenção 169 da OIT, ao reconhecimento identitário de comunidades quilombolas, e aos questionamentos destas, quanto a possibilidade de deslocamentos compulsórios. Neste sentido, objetiva-se refletir sobre os conflitos socioambientais e as resistências dessas comunidades frente ao referido projeto de infraestrutura. Assim, analisar as formas organizativas, as mobilizações desses grupos, as pautas de reivindicações frente ao DNIT, e ao INCRA, a Fundação Cultural Palmares, ao Ministério Público Federal, são temas que não se ausentarão desta análise.