GT 31. Economias indigenas e quilombolas e as trocas generalizadas
Coordenador(es):
Amanda Cristina Danaga (UEMS - Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul)
Lígia Rodrigues de Almeida (FUNAI)
Sessão 1
Debatedor/a: Flávio Rodrigo Freire Ferreira (IFRN - Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte)
A proposta do GT é criar um fórum de interlocuções com pesquisadores que investigam as diversas formas de organizações econômicas de populações indígenas e quilombolas, operacionalizadas para garantir a sobrevivência física e cultural dentro de um Estado capitalista. Com a expansão colonial europeia na América e especificamente no Brasil, indígenas e, posteriormente comunidades quilombolas, sofreram com as intervenções advindas dos avanços da economia capitalista de mercado de maneiras bem diversificadas. Na região amazônica, por exemplo, durante o século XVIII, o regime de regatão prevaleceu e, no século XIX até os dias atuais, o sistema de aviamento tornou-se operante. Esses dois formatos de relações econômicas foram os propulsores dos intercâmbios comerciais entre indígenas e não indígenas em boa parte das terras baixas da América, estabelecendo uma relação assimétrica entre patrões-fregueses, posseiros e meeiros. No nordeste brasileiro e outras regiões da América, o ajuri (mutirões comunitários), a mita, o meeiro, as trocas recíprocas e generalizadas vinculadas às práticas “tradicionais” de produção, modalidades econômicas manejadas por indígenas e quilombolas que fomentam o sustento necessário para a sobrevivência. No contexto de inserção em diversos formatos econômicos e de trocas generalizadas, o GT visa dialogar e refletir sobre as situações econômicas e as peculiaridades aludidas por indígenas e quilombolas e suas intersecções com os Estados e a economia capitalista.
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A beleza de um cavalo: anabolizantes de uso veterinário, comportamento e geração por atletas de fisiculturismo. Autoria: Gabriel Salgado Ribeiro de Sá (UFJF - Universidade Federal de Juiz de Fora) Autoria: Discute-se á experimentação humana, para fins estéticos, de duas classes de andrógenos (anabolizantes) normalmente utilizados para fins veterinários: Acetato de Trembolona e Undecilenato de Boldenona. Através de diálogos com atletas de fisiculturismo, são priorizadas as relações entre o corpo permeável e o ambiente, de modo que as distinções entre substância material e experiência imaterial se tornam borradas. Por este ângulo, analisaremos o ponto de vista dos atores frente a sua experimentação, de tal modo que as substâncias ganhem papel determinante tanto na construção de si próprio (biologicamente) quanto culturalmente (sua identidade). Analisaremos como essas pessoas vivenciam o uso de substâncias, no qual, as consequências podem ser permanentes ou não: desde a mudança da estrutura facial, quanto ao estabelecimento de uma masculinidade descrita como de agressividade, impulsividade, de ansiedade e depressão. Metodologicamente seguiremos uma etnografia Person-centered onde analisaremos as trajetórias de experimentações farmacológicas de atores selecionados, observando o impacto do uso de substâncias consideradas pelos próprios como neurotóxicas e como acarretam modos de conduta desviantes. Verificaremos o impacto destas construção do próprio físico, da masculinidade, e nas relações familiares que podem ser afetadas em maior ou menor grau pela utilização. Por fim, de modo secundário a este primeiro debate analisaremos um tipo particular de medo geracional: se as substâncias acarretam mudanças biológicas, seriam passíveis de serem perpassadas epigeneticamente? Quais seriam as possíveis consequências pelo ponto de vista dos próprios? Reflexiona-se então a maneira pela qual o conhecimento epigenético está se tornando um fenômeno social e seus possíveis impactos para o consumo de drogas, de modo que os malefícios do uso de substâncias tóxicas começam a ser imaginados geracionalmente.
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Consumo de drogas e Sistema de Justiça: uma reflexão a partir das Turmas Recursais Criminais do Estado do Rio de Janeiro Autoria: Mário José Bani Valente (UFF - Universidade Federal Fluminense) Autoria: As drogas ilícitas e seu consumo têm se tornado, nas últimas décadas, temática relevante nos debates sobre o sistema de justiça criminal no Brasil. O tratamento dispensado por esse sistema aos usuários e aos traficantes é ponto central da polêmica sobre a discricionariedade na decisão judicial sobre essa diferenciação e fomentado importantes pesquisas. Nesse contexto, parece-me relevante compreender as “sensibilidades jurídicas” que norteiam a prática dos operadores do direito, no que concerne aos conflitos envolvendo o consumo de drogas.
Partindo dessa problemática abrem-se alguns questionamentos: Como é tratado o consumo de drogas ilícitas? Qual a administração institucional levada à cabo aos consumidores? De modo a abrir algumas reflexões sobre estas questões, tomo como referência o ponto de vista dos magistrados da 1ª e 2ª Turmas Recursais Criminais do Estado do Rio de Janeiro, que são colegiados que tem a função de julgar os recursos contra decisões dos Juizados Especiais Criminais (JECrims), a fim de mapear os discursos e as práticas jurídicas que compõe importante elemento no controle sobre as drogas e sobre aqueles que as consomem.
Nesse contexto, a partir do work de campo inicial levado à cabo nas referidas Turmas Recursais Criminais, foi possível perceber a quase completa uniformidade nas decisões por parte dos operadores do Direito nas Apelações Criminais que ali chegam. Soma-se a essa primeira percepção a falta quase que completa de discussão sobre as especificidades de cada caso, sendo que, para evidenciar tal situação, em algumas situações diferentes recursos são decididos e votados pelos membros de forma conjunta.
Assim, de forma a compreender a dinâmica construída nestes espaços, busco lançar o olhar para dois argumentos constantemente mencionados e que aparentam consolidar a atuação de certa forma pragmática, descrita brevemente acima, por parte dos magistrados, quais sejam: o princípio da colegialidade e a celeridade processual. Aliado a isso, para além da observação de tais espaços, através de entrevistas a serem empreendidas com os operadores que compõem ambas as turmas, busco compreender como estes constroem um conhecimento sobre o uso de drogas e de que forma pode-se pensar em uma linha que conecta tal construção com a atuação destes.
Portanto, na presente proposta busco refletir, a partir da compreensão sobre as drogas e da atuação nos casos de uso de drogas dos magistrados das Turmas Recursais Criminais do Estado do Rio de Janeiro, sobre os discursos produzidos e sobre a dinâmica operacional geridas nestes espaços, tendo como ponto final quais as consequências destas questões para o controle do consumo de drogas ilícitas.
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Do Sagrado ao marginal: estudos de caso da Ska Pastora e do fenômeno da Salvia divinorum. Entre o étnico e o contemporâneo, o legal e o ilegal, ou o lugar do saber científico vs o uso fora desse saber Autoria: Queli Baptista (UFF - Universidade Federal Fluminense) Autoria: A planta conhecida como Ska Pastora, nativa da região de Oaxaca no México, foi apropriada pela ressignificação no meio contemporâneo através do nome de Salvia divinorum e, fatidicamente, criminalizada nesse mesmo meio ao longo do tempo. Nomenclatura que foi trazida pelos pesquisadores do início dos anos 60 que a classificou num gênero dentro das especies de sálvias existentes e em referência ao seu uso divinatório. Contextualmente ela também foi inserida dentro dos movimentos de “psicodelia” dos anos 60 nos Estados Unidos e em outros demais contextos. Pode ser encontrado algumas pesquisas sobre essa planta feitas por botânicos, etnobotânicos ou outros pesquisadores desde os anos 30 chamando-a inicialmente como hierba María. Portanto contei com um material bibliográfico produzido tanto por fontes acadêmicas como não acadêmicas, somando alguns works e relatos de pesquisadores e adeptos desta planta desde os anos 30 até os dias atuais com quais tive contato. Observando diversos depoimentos e situações jurídicas, através de adeptos, de fóruns e de documentos oficiais que também envolveram o processo de criminalização aqui no Brasil, e em outros lugares num processo desde 2002. Contrastando paradoxalmente a sociedade e suas normativas legais nesse caso, assim como para outras plantas enteógenas como a cannabis, o ópio ou outras, que mesmo indo parar em contextos da esferal legal e jurídica (ou dentro de uma regulamentação “higienizadora” de uma sociedade moral sobre outra) das substâncias psicoativas e ocupando o lugar de produto ilegal em muitos países para a população comum, essas plantas acabam se tornando veículo e meio quase exclusivo de uso legal pelo saber médico, farmacêutico ou científico; tirando assim esse recurso/ente das mãos da população por vias comuns e sendo acessível para essa parcela populacional apenas através das margens ou, intermediada por esse agente “permitido” como é, por exemplo, a esfera farmacêutica. É pensar então na lógica de compor a substância ao espaço que ela está vinculada, como o meio étnico e seu valor e uso tradicional (medicinal e religioso) olhando quando houver suas mudanças nesse mesmo meio, ou contemporâneo e seus variados meios e inclusive o da apropriação médica/farmacológica; fazendo uso de um exercício de reflexão de deslocamentos de perspectivas, lugar social, práticas de uso, agências e veículos de interação e suas redes em torno dessas plantas. Assim como contrapondo nesse quadro uma crítica do peso influenciador de uma sociedade moral sobre essas questões até mesmo para a extinção desse recurso do meio biodiversificado. Além também das implicações que há sobre essa interação com esse enteógeno por parte do saber tradicional, e da ação dos poderes de regulamentação sobre esse ou outros enteógenos.
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Encontros e deslocamentos do Nixi Pae Autoria: Caroline de Brito Santos (UERJ) Autoria: Nos últimos 15 anos, diferentes etnias indígenas vêm se inserindo e ampliando sua participação nos circuitos urbanos de rituais xamânicos. Este work resulta do acompanhamento de rituais de nixi pae (ayahuasca ou cipó) conduzidos pelos Huni Kuin, povo pano do Acre, no Rio de Janeiro. Em geral, essas cerimônias ocorrem através de agentes intermediários que atuam na organização das atividades da comitiva indígena durante sua permanência na cidade e seus arredores.
O encontro entre brancos e índios nos “works” realizados em cenários urbanos envolvem deslocamentos espaciais e simbólicos tanto do público participante como dos Huni Kuin. Se os visitantes dos centros urbanos, predominantemente ligados às expressões e práticas Nova Era, estão em busca da medicina sagrada em um contexto ritual de alteridade e vinculado à noção de originalidade indígena, também os Huni Kuin são sujeitos em certa medida deslocados de seus mundos, que ali estão simultaneamente como hóspedes e anfitriões. As transformações por que passam os ritos urbanos do Nixi Pae em relação aos modos como eles são realizados nas aldeias são maneiras de estabelecer comunicação e permitir o engajamento dos participantes. De fato, a bebida amazônica tem operado como um mediador relevante nas recentes relações dos Huni Kuin com as sociedades ocidentais modernas, assumindo não apenas dimensões religiosas e terapêuticas, mas também políticas.
Neste work dedico-me às produções de sentidos implicadas no contato entre mundos diversos. Mas essas relações são também marcadas por processos de “equivocação controlada” (Viveiros de Castro, 2004) que atravessam a comunicação entre brancos e ameríndios, conforme explora Coutinho (2016) ao apontar para os efeitos comunicacionais produzidos pela convergência entre termos da cosmologia indígena (Yube) e da psicanálise (inconsciente). Procuro atentar para esses trânsitos, fluxos e traduções de sentidos que circulam particularmente em torno das dimensões terapêuticas do ritual. Yube é a jiboia, ser encantado que engole aqueles que estão na “força” do cipó, conduzindo-os a outro mundo. Na ontologia Huni Kuin, baseada em um modelo de alteridade por gradação (Lagrou, 2002, 2018), a força do cipó abre caminho para a experimentação de mundos outros e coexistentes com o mundo habitado, o que produz uma experiência de devir-outro que parece fluir em uma direção diversa daquela que encontramos nos meios Nova Era, marcados pela busca pelo si mesmo, pelo eu verdadeiro, pela singularidade despida de identidades socialmente constituídas. Nesse sentido, busco refletir sobre os encontros e deslocamentos produzidos nesses rituais, particularmente em relação aos modos como os Huni Kuin e o público frequentador percebem as relações entre cura e alteridade.
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Estratégias de legitimação do "problema mundial das drogas" Autoria: Dayana Rosa Duarte Morais (Abrasco), Martinho Braga Batista e Silva Autoria: O início do século XX foi marcado pelo começo do debate sobre drogas. A partir de sua publicização enquanto questão que deveria extrapolar a vida privada, as drogas passaram a ocupar o drama público (GUSFIELD, 1984; BOURDIEU, 2014) mobilizando países em torno de um “problema mundial das drogas”. Expressão da continuidade desse processo é o fato da Organização das Nações Unidas (ONU) ser a responsável por categorizar substâncias enquanto sua legalidade, o que faz desse organismo multilateral um centro ideal do campo das drogas. Então, sob o argumento de proteção à saúde e bem-estar, a ONU sugere a proibição de determinadas substâncias: trata-se do chamado consenso de Viena, materializado na Convenção Única de Entorpecentes de 1961. Neste criado Sistema Internacional de Controle de Drogas (SICD), a Redução de Danos representa a racionalidade do campo da saúde responsável por, em 2009, quebrar este consenso (BEWLEY-TAYLOR; JELSMA, 2013), contrapondo o proibicionismo. Dessa forma, nosso objetivo na presente pesquisa é compreender quais são as estratégias de legitimação no Sistema Internacional de Controle de Drogas (SICD). Para tanto, foi realizada uma etnografia de eventos e de documentos, que contaram com entrevistas semi-estruturadas com pessoas envolvidas no “problema mundial das drogas”, com a realização de observação participante da 62ª Sessão de Drogas Narcóticas da ONU (2019) e da adoção enquanto artefato da resolução brasileira apresentada e aprovada no evento. Tratava-se de uma ocasião em que foi avaliada a última década de política de drogas no mundo, e planejavam-se os próximos 10 anos. É também um momento em que a comunidade internacional debate os esforços para a inclusão das políticas sobre drogas no contexto da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, quando o consenso que até então existia em torno do “problema mundial das drogas” mostra sinais concretos de ruptura com a até então hegemonia mundial do proibicionismo.
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Os Clubes Sociais de Cannabis (CSC) na Comunidade Autônoma do País Vasco (CAPV), Espanha: a filosofia de redução de riscos e danos, a luta pela normalização do consumo da maconha e uma proposta concreta de regulação Autoria: Guilherme Borges da Silva (UFG - Universidade Federal de Goiás), Wanderley Pereira da Silva Junior Autoria: Esta proposta de work visa apresentar os resultados de uma jornada investigativa de doutorado sanduíche realizada na cidade de San Sebastian, Comunidade Autônoma do País Vasco (CAPV), situada ao norte da Espanha, acerca dos Clubes Sociais de Cannabis (CSC). Os clubes são entidades sem fins lucrativos e compostos por pessoas maiores de idade consumidoras de maconha. Baseiam-se na filosofia de redução de riscos e danos, e entre os objetivos do funcionamento dos CSC destacam-se a busca pela normalização do consumo da planta na região e a promoção de um consumo responsável. Através da análise bibliográfica e da investigação de campo, pretende-se explorar os seguintes pontos: 1) Uma breve apresentação sobre a formação, organização e funcionamento dos CSC na CAPV, dando ênfase aos instrumentos teóricos e filosóficos que dão base à concepção dessas entidades, como a filosofia de redução de riscos e danos, a busca pela normalização do consumo da planta e a luta por uma política canábica que promova o consumo responsável e que esteja ancorada aos princípios de um estado democrático de direito e em garantia aos direitos humanos; 2) Os desafios e as contradições dos CSC no contexto da legislação proibicionista espanhola e; 3) Por fim, os principais pontos da proposta do novo modelo de regulação dos CSC na CAPV produzido, em 2017, pelo Grupo de Estudios de Politicas sobre El Cannabis (GEPCA).
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Os usos da ayahuasca e o campo religioso brasileiro: dos direitos religiosos à política cultural. Autoria: Sandra Lucia Goulart (Faculdade Cásper Líbero) Autoria: Apresentaremos uma análise sobre as ações políticas dos principais atores do campo religioso ayahuasqueiro brasileiro. A abordagem desta questão segue uma linha histórica, com a identificação de diferentes fases destas ações e relacionamentos políticos. Identificamos três fases desta história. Um primeiro momento, quando se organizam grupos religiosos na região amazônica, marcado por relações pessoais entre os fundadores destes grupos e representantes políticos locais. Uma segunda fase, iniciada na década de 1980, com o movimento de expansão destes grupos no país e no exterior, caracterizada com o começo das regulações do Estado brasileiro sobre os usos da ayahuasca e pelo processo inicial de construção de legitimação pública destes grupos, culminando com o reconhecimento do direito do uso religioso da ayahuasca. Nesta fase, as relações entre representantes de grupos ayahuasqueiros e gestores do Estado deixam de ser pessoais e ocasionais, se tornando regulares, com a ampliação de alianças com setores públicos em âmbitos municipal, estadual e federal, visando garantir a criação de políticas constantes relativas à ayahuasca. A terceira fase se inicia em 2008, com a reivindicação do reconhecimento do uso da ayahuasca como patrimônio cultural brasileiro, indicando alterações mais fortes nas estratégias de atores e grupos do campo ayahuasqueiro com relação às suas formas de apresentação pública e de relacionamentos com o Estado. Sustentamos a ideia, nesse work, que os principais grupos e sujeitos relacionados à ayahuasca no Brasil vêm conquistando sua legitimidade social e ampliando seus direitos conforme construíram modos de se afastar da questão e do debate público sobre as drogas. Procuraremos mostrar que a conquista do direito do uso religioso da ayahuasca e as recentes demandas relativas à inclusão deste fenômeno nas políticas culturais do Estado brasileiro expressam esse processo, resultando de diferentes escolhas, estratégias e projetos políticos destes grupos e sujeitos. Destacaremos, ainda, a emergência, nos últimos anos, dos chamados neoayahuasqueiros e de novos contextos indígenas de usos desta bebida, dois fatos que têm provocado profundas alterações no campo ayahuasqueiro brasileiro, impactando as posições de seus diversos atores e questionando o protagonismo das religiões ayahuasqueiras brasileiras sincréticas. De um modo mais amplo, pretendemos relacionar a história destes atores e grupos ayahuasqueiros aos estudos sobre o campo religioso brasileiro, procurando situá-los em relação a atores tradicionais deste campo religioso, tal como: a Igreja Católica, os cultos afro-brasileiros, o espiritismo Kardecista e as denominações evangélicas, estabelecendo comparações entre seus variados modos de construção de legitimidade pública.
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Qual o lugar do indivíduo não-heterossexual dentro de uma Comunidade Terapêutica Religiosa? Autoria: Janine Targino da Silva (UCAM - Universidade Cândido Mendes) Autoria: Esta comunicação tem a intenção de descrever e analisar a trajetória de indivíduos não-heterossexuais no que diz respeito a busca por recuperação da dependência química no âmbito de uma comunidade terapêutica religiosa (CTR). Ao longo da discussão nos nortearemos pela definição de CTR presente em Ribeiro & Minayo (2015), na qual as CTR's (também chamadas de Centros de Recuperação) são identificadas como espaços financiados ou cofinanciados por entidades religiosas e pelo Estado que atuam com o objetivo de recuperar dependentes de drogas fundamentalmente através da abstinência. Conforme destaca Monteiro (2012, p. 137), “em sua grande maioria, as comunidades terapêuticas são oriundas da religião protestante”. Destaca-se que o principal projeto terapêutico das CTR's é o tratamento religioso, que pode substituir ou agregar outras modalidades de tratamento, como a medicamentosa, por exemplo. Além disso, nota-se que as CTR's expandem o raio de alcance de igrejas que se empenham em promover a evangelização em bocas de fumo e cracolândias. Os dados apresentados nesta comunicação são provenientes de entrevistas semiestruturadas, além das observações de campo em duas CTRs localizadas na cidade do Rio de Janeiro. Através da análise dos dados coletados ao longo da pesquisa pode-se concluir que, quando adentram uma CTR em busca de tratamento, indivíduos identificados como não-heterossexuais são atendidos sob circunstâncias singulares e sujeitos a discursos profundamente atravessados por moralidades religiosas.
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Representações da redução de danos no interior da política: o CAPSad no Rio de Janeiro Autoria: Beatriz Brandão (USP - Universidade de São Paulo) Autoria: As definições da redução de danos (RD) não se expressam de forma monolítica no cotidiano da política pública. Partindo dessa premissa, o objetivo deste artigo é apresentar como a RD se manifesta na fala de usuários de quatro CAPSad no Rio de Janeiro e como acionam tal abordagem para reconhecer e dar sentido aos seus circuitos e paragens. Seja no work diário dos profissionais do CAPSad, que demarcam essa posição a cada discussão de caso, ou nas narrativas dos usuários do sistema da saúde mental, encontramos clivagens nos modos em que a RD é trazida como argumento nas tomadas de decisão. A partir da análise de 50 entrevistas em profundidade e a participação em reuniões institucionais da Secretaria Municipal de Saúde, produzo este texto com o intuito de apresentar algumas das principais representações visíveis entre usuários. Sabendo que o problema se inscreve num cenário maior, que vai da formação na visão institucional da superintendência de álcool e drogas (AD) até histórias miúdas de usuários, opto, neste momento, por uma análise com o recorte das entrevistas dos pacientes. A escolha se dá porque suas falas revelam a lógica de escolha de seus itinerários terapêuticos e acredito que tais itinerários são ordenadores de um fundamento nos circuitos e paragens que acessam e interfere a rede de atenção psicossocial (RAPS). Sendo assim, o estímulo primordial da proposta se dá em articular como os casos expressos nas falas dos usuários alcançam a rede, podendo coloca-la a pensar sobre sua estrutura e como se compõe na concepção de RD que emprestam e empregam em seus cotidianos.
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Transformações e reinvenções do Santo Daime a partir das traduções do xamanismo Yawanawá (Pano) Autoria: Lígia Duque Platero (UFF - Universidade Federal Fluminense) Autoria: O tema do artigo é o diálogo xamânico estabelecido entre adeptos de uma igreja do Santo Daime do Rio de Janeiro e membros do povo indígena Yawanawá (Pano), das aldeias Mutum e Nova Esperança, do Acre. Em meio a esse diálogo, ocorre uma dupla transformação: cada parte da relação se transforma a partir das traduções que realiza em meio ao diálogo com o outro. São essas traduções e transformações - tendo em vista o ponto de vista dos adeptos do Santo Daime – que busco explorar neste artigo. Desde 2009, os adeptos de uma igreja urbana do Santo Daime do Rio de Janeiro adotaram o consumo de algumas medicinas da floresta – rapé, sananga e kambô, e produziram novos hinos, danças, imagens e dietas (as santas dietas), relacionadas ao xamanismo Yawanawá.
Nesse sentido, pergunto-me: como os adeptos do Santo Daime dessa linha expansionista vem traduzindo e ressignificando o xamanismo Yawanawá, produzindo novas diversificações do Santo Daime? Essas transformações podem ser consideradas como uma nova forma de reinvenção da tradição do Santo Daime? Assim, o problema do problema do artigo se refere às traduções equívocas (Viveiros de Castro, 2004) daimistas em relação ao xamanismo Yawanawá, e a produção de transformações e reinvenções da tradição. Assim, o objeto do artigo é a questão da diversificação do Santo Daime dessa linha expansionista em meio a esse diálogo com esse outro indígena.
work com a hipótese de que as traduções equívocas em meio ao diálogo xamânico são um processo inventivo, produtor de transformações na cosmologia e nos rituais do Santo Daime, e diferenciações nessa religião ayahuasqueira e/ou xamanismo coletivo (Couto, 1989). Essas traduções daimistas ocorrem a partir de uma linguagem espírita e umbandista, com ênfase no diálogo entre espíritos humanos e não humanos. Parto da hipótese de que essas transformações podem ser consideradas também como reinvenções da tradição ou da cultura. Como objetivos do artigo, busco descrever e analisar as traduções daimistas relacionadas à adoção de plantas-espírito (sobretudo o rapé e a sananga), e a adoção e ressignificação de cantos, de danças, da estética e de dietas Yawanawá. Busco também analisar as convergências e divergências do conceito de transformação usado na Etnologia Sul-americana e o conceito de reinvenção das tradições, utilizado no campo de pesquisas sobre ayahuasca. Ao longo do artigo, dialogo com pesquisas sobre transformações ameríndias, Santo Daime, ayahuasca e medicinas da floresta (rapé, sananga e kambô), sobretudo com a bibliografia que aborda a questão do diálogo xamânico entre Santo Daime e povos indígenas. Este work é baseado em observação participante, realizada na igreja carioca entre 2015 e 2017, e na Terra Indígena Rio Gregório, em julho de 2016.
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Usos medicinais de maconha, ativismo e produção de conhecimento: experiências no Brasil e no Chile Autoria: Luciana C. de Campos Barbosa (UENF - Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro) Autoria: Os usos medicinais de maconha tem sido foco de debates em torno do direito à saúde e sobre políticas de drogas em toda a América Latina. Mesmo em países nos quais o cultivo da planta não foi regulamentado, como no Brasil e no Chile, seus usos têm se difundido como possibilidade de tratamento para diversas enfermidades. O presente work buscou compreender como tais usos têm sido viabilizados, quais conhecimentos o embasam e como tais conhecimentos são produzidos, uma vez que a planta é ainda proibida na maior parte do mundo. Os dados apresentados resultam da pesquisa realizada entre os anos 2017 e 2019 nas cidades do Rio de Janeiro/Brasil e Santiago/Chile, elaborada a partir da observação participante, realização de entrevistas semiestruturadas e análise documental. As conclusões apontam que o conhecimento em torno dos usos medicinais de maconha, como dosagens, tipos de plantas, técnicas de cultivo e a elaboração do óleo artesanal, tem sido produzidos principalmente por uma rede colaborativa por meio da qual circulam informações, relatos de experiências, sementes, mudas, flores e tudo o que diz respeito à maconha. Howard Becker já chamou atenção para o fato de que usuários de drogas ilícitas desenvolvem seus conhecimentos sobre as substâncias que consomem a partir de uma rede informal de comunicação por meio da qual circulam experiências e informações resultantes de suas pesquisas individuais. A presente pesquisa acrescenta que, no caso da maconha, essa rede tem se expandido com o desenvolvimento dos usos medicinais da planta, que ampliaram a circulação das informações acerca da canabis, não estando mais circunscrita a usuários de maconha, mas também aos familiares de usuários medicinais, que levam consigo experiências de suas carreiras como pacientes de doenças de difícil controle. Essa expansão da rede canábica pode ser simbolizada pelo encontro entre expertises de cultivadores e mães de crianças com doenças raras e difícil controle. A formalização desses atores nas associações canábicas tem fomentado não apenas o aumento dessa rede de comunicação e troca de conhecimento, como acionado instituições de pesquisa, promovendo a produção de conhecimento científico. O conhecimento colaborativo produzido por esses grupos, ao ser corroborado por médicos engajados e apoiado por advogados ativistas tem resultado no acesso a tal tratamento por meio da judicialização da saúde e na produção de conhecimento científico, por meio do acionamento de instituições de pesquisa.
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“Tesouro farmacológico”: a pesquisa médica brasileira sobre maconha e suas controvérsias Autoria: Hellen Monique dos Santos Caetano (UFAL - Universidade Federal de Alagoas) Autoria: Quando pensamos no uso de maconha no início do século XX, temos profissionais da medicina como protagonistas na corrida para perpetuar a proibição da planta. Historicamente, os saberes médicos têm lugar privilegiado na produção de verdades hegemônicas e isso não foi diferente a respeito da Cannabis. Atualmente, vivemos um processo de “redescoberta” dos usos terapêuticos dessa planta. As redes formadas em torno da busca pela regulamentação e legalização da maconha para fins terapêuticos no Brasil são marcadas pelo ativismo de familiares e pacientes que desenvolveram técnicas eficazes para sua utilização, configurando uma inversão da lógica tradicional entre os saberes. Existem registros do uso de princípios ativos da maconha, como o THC e o Canabidiol, para tratar inúmeros adoecimentos e seus sintomas, como epilepsia refratária a outros medicamentos, glaucoma e Alzheimer. Esses usos estão envoltos em controvérsias no que diz respeito a aplicabilidade dessa planta de forma medicinal. Isso acarreta em poucos médicos prescrevendo e produzindo works científicos voltados para o uso da maconha como “medicamento”. No processo desta pesquisa, são considerados artigos científicos publicados em periódicos de saúde, resoluções e notas técnicas da Anvisa, além de documentos produzidos pelo Conselho Federal de Medicina e Associação Médica Brasileira, entre 2014-2019, reconhecendo o caráter heterogêneo dessa discussão. A partir de uma análise documental qualitativa, este work tem como intuito compreender as controvérsias em torno da produção de conhecimento dos saberes médicos sobre o uso de Cannabis no Brasil. Acompanhar a construção de controvérsias é um dos pontos chave dos estudos sociais da ciência, que buscam tencionar padrões hegemônicos e atentar para as práticas e agenciamentos que constituem as informações relevantes para cada uma das frentes em disputa. Neste work, identificamos quem tem pesquisado sobre maconha, bem como a relação entre ciência e tecnologia, o surgimento de patentes e a relação de médicos brasileiros com a indústria farmacêutica. Nosso objetivo é tencionar essas produções, não com o intuito de deslegitima-las, mas evidenciar o caráter social da produção científica, que está em constante relação com o mundo, seus processos, tensões e coalizões.
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O Uso da Maconha em Ambiente Universitário: conflitos locais, controvérsias públicas e ativismo Autoria: Amine Gomes da Silva Felix (UFF - Universidade Federal Fluminense) Autoria: Este work pretende traçar um paralelo entre o que se entende como Cultura Jovem e o uso de maconha na universidade através da análise de dados de campo de uma pesquisa etnográfica já em andamento, intitulada, provisoriamente, de “O Uso da Maconha e o Reordenamento dos Espaços de Convivência na Universidade Federal Fluminense de Campos dos Goytacazes-RJ”. A primeira parte da pesquisa se ocupou em realizar uma etnografia com os grupos de estudantes que são usuários de maconha com o intuito de se aproximar de suas práticas e seus modos de lidar com a droga no ambiente universitário. No desenvolvimento da pesquisa, a observação foi concentrada nos modos através dos quais estudantes e ativistas organizaram eventos acadêmicos que culminaram, entre outras coisas, na I Maconha de Campos dos Goytacazes-RJ, ocorrida no dia 19 de maio de 2018. A observação deste fenômeno social, que metodologicamente tem se servido da etnografia tradicional, no último ano contou com uma abordagem que vem sendo conhecida como “netografia”, para dar conta de sua dimensão e complexidade tal como tem se configurado nas redes sociais virtuais.
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