GT 036. Etnografias da deficiência
Olivia von der Weid (UERJ) - Coordenador/a, Fagner Carniel (UEM) - Coordenador/a, Adriana Abreu Magalhães Dias (UNICAMP) - Debatedor/a, Nádia Elisa Meinerz (Universidade Federal de Alagoas) - Debatedor/aDeficiência é uma categoria em disputa, em constante reconstrução, que apresenta amplo potencial analítico, político e metodológico para a antropologia. Este grupo de trabalho visa dar continuidade às activitys desenvolvidas desde a 29ª RBA, reunindo estudos etnográficos que abordem perspectivas diversas sobre os corpos, os direitos, os fazeres, os lugares, os medicamentos, as políticas, os desejos, os prazeres, as tecnologias e as experiências de pessoas com deficiência e com doenças raras. Serão privilegiadas propostas que considerem: a) o papel dos movimentos sociais e das políticas públicas para pessoas com deficiência na construção das condições e parâmetros relativos aos direitos e cidadania, tais como cuidado, acessibilidade, inclusão escolar, vida autônoma, etc; b) narrativas e práticas de pessoas com deficiência que organizam a inserção de sujeitos concretos em diferentes coletividades; c) ensaios teóricos, realizados a partir do amadurecimento etnográfico, que problematizem a categoria deficiência pelo referencial antropológico, seja a partir dos debates contemporâneos da disciplina, seja pela articulação com categorias analíticas no diálogo com outros campos como saúde, direito, linguística, etnologia, gênero e sexualidades, raça, etnia e racismo, ciência e tecnologia, dentre outros; d) por fim, são bem vindas as reflexões sobre os desafios e adequações do/no método etnográfico, produzidas a partir das tensões encontradas no campo de pesquisa sobre a deficiência.
Resumos submetidos |
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: Do falar dos corpos e de falar de corpos: Surdos no Candomblé e o sagrado selvagem da comunicação não oral nas religiões afro-brasileiras Autoria: José Renato de Carvalho Baptista Autoria: Este work apresenta uma investigação preliminar acerca da experiência religiosa dos surdos nas religiões de matriz africana, notadamente o candomblé no âmbito do Estado do Rio de Janeiro e como são as relações entre surdos/não surdos num ambiente marcado pela presença da língua falada e do som como mecanismos de acesso à experiência do sagrado. Pela nossa hipótese, a experiência da possessão no candomblé, em virtude da centralidade do corpo como acesso às divindades, inicialmente, não distingue o “corpo surdo” de um “corpo não surdo”. Nosso propósito é coletar experiências que nos permitam discutir essa hipótese.
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A surdez como experiência sensível: para além de “cultura” e “identidade” Autoria: Daniele Lemos Moreira Autoria: O presente work pretende etnografar a experiência perceptiva de sujeitos surdos e sua relação com o campo discursivo que o envolve, entendendo que tal abordagem oferece uma alternativa analítica para se pensar o sujeito surdo distanciando-o da categoria deficiente. Para cartografar os discursos presentes no campo, vamos tomar uma distância analítica dos conceitos de “cultura” e” identidade” surda - conceitos estes que assumiram um protagonismo a partir, especialmente, da consolidação da Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS – enquanto língua oficial das comunidades surdas do Brasil, através da Lei Federal de número 10.436, de 24 de abril de 2002. Minhas categorias de investigação objetivam compreender sua corporalidade específica, seu modo de sentir particular e sua consequente construção subjetiva. A pesquisa estruturou-se a partir de uma abordagem etnográfica realizada em uma turma bilíngue para surdos da Escola Municipal Paulo Freire, localizada no município de Niterói, Rio de Janeiro. Para tanto, utilizou-se como referencial teórico a discussão que envolve o conceito de corpos abjetos de Judith Butler e a discussão empreendida por Tim Ingold sobre o campo da antropologia da percepção.
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Corpos e dissidências: figurando invisibilidades Autoria: Sarah Victória Almeida Rodrigues Autoria: Dorothy Shoes é uma artista visual e fotógrafa que foi diagnosticada com Esclerose Múltipla na véspera dos seus 33 anos. Lotje Sodderland, cineasta, foi surpreendida por um AVC quando estava sozinha em sua casa. José Leonilson foi um artista plástico e teve o veredito da Aids confirmado em seu corpo na década de 1980. Os três produziram obras visuais e artísticas a partir de acometimentos abruptos que os levaram a repensar suas relações com seus corpos, as imagens e o mundo. A partir dessas novas configurações de si, esses artistas se dedicaram a produzir visibilidades figurando o caráter invisível de suas condições e práticas cotidianas, apagamentos orquestrados frequentemente por suas relações médico-pacientes e seus itinerários terapêuticos. Esse work tem o esforço de compreender a dinâmica de produção visual como um processo que se amplia às percepções dos corpos e subjetividades utilizando esses suportes como ferramentas que ratificam formas de ser e estar no mundo na possibilidade de habitá-lo para além de si. Como considera a antropolóloga Anahi Mello (2016), “a deficiência não se encerra no corpo, ela consiste no produto da relação entre um corpo com determinados impedimentos de natureza física, intelectual, mental ou sensorial e um ambiente incapaz de acolher as demandas”. Entre os modelos médico e social da deficiência, a reflexão sobre o deslocamento deste conceito para discussões contemporâneas afim de repensar corponormatividades é proposta pelo diálogo com as artes. Ao pensar a produção de imagens, a dimensão de representação é muito frequentemente acionada e, na dinâmica que se busca aqui investigar, pode também ser deslocada ao colocar os sujeitos no centro de suas representações. Considerando essa composição de arte e saúde/doença, esses suportes pelos quais a vida é reinventada constantemente podem ser, assim como considera Ingold (2012), caminhos e trajetórias compreendidos em infinitas linhas “ao longo das quais as coisas são continuamente formadas”. Meu objetivo nesta narrativa é refletir como a interrupção de uma forma de existir não é a interrupção de uma forma de ser, mas uma dinâmica de seguimento a ser refeita (desfeita e feita) continuamente e que questiona a prevalência de como se configura no e o mundo. Na perspectiva do fazer artístico que produz e reproduz conhecimento por meio da figuração, o agir é compreendido como uma das maneiras de “trazer as coisas de volta à vida” (INGOLD, 2012), uma vez que "se as imagens são capazes de intervir no mundo, é porque tal mundo já é habitado por imagens" (HEAD, 2009).
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Corpos e identidades que escapam: uma análise autoetnográfica da mulher deficiente ou aquilo que o Direito não vê Autoria: Gabriella Sabatini Oliveira Dutra Autoria: O presente work faz-se como experimentação a partir do diálogo entre os relatos da minha vivência cotidiana como mulher deficiente e as inquietações trazidas por autoras acadêmicas, na tentativa de complexificar questões relacionadas a gênero e deficiência. Deste modo, o texto se apresenta de maneira indiscreta, tanto às formas tradicionais de produção de conhecimento quanto ao modo como atua o Direito hegemônico (aquele apresentado como neutro e universal, que cria normas e aplica sanções). Assim, o debate se delineia através da autoetnografia, que permite tatear formas de vida alternativas, tornando necessário me posicionar como mulher deficiente com lesão visual parcial, branca, acadêmica e ativista, um lugar de onde "fala com" e "não fala por", traçando o processo pelo qual o work se desenvolve (DONNA HARAWAY, 1995). Dessa forma, são pontos importantes neste estudo: a experiência da mulher deficiente apresentada através da autoetnografia, a desnormalização dos corpos, o caráter identitário desses corpos, e, por conseguinte, a ética da interdependência. Neste sentido, ao trabalhar com a autoetnografia surgem questões relevantes como: qual lugar a mulher deficiente tem na academia? Ser a pesquisadora que tem seu íntimo marcado através do work de campo com outras mulheres deficientes? Ou, ser a deficiente que marca o íntimo de outras pesquisadora?
Essa sempre foi uma das minhas principais inquietações, sobre como contrariar as formas colonizadoras de produção de conhecimento por meio da experiência. Mas a questão mais intimidadora envolve o seguinte fato; a pesquisa acadêmica sobre mulheres deficientes se restringe a falar sobre elas, concebendo e tornando possível sua existência na academia? Falando sobre essas mulheres de que maneira, para quem e com qual objetivo?
Com efeito a análises dos corpos como esfera de normalização e da constituição das identidades das mulheres deficientes serão realizadas por meio da autoetnografia.
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Domesticar o olhar? Reflexões metodológicas sobre pesquisa com pessoas cegas assistidas por cães-guia Autoria: Maria Kerolayne Rocha Autoria: A inserção do cão-guia nas atividades cotidianas de uma pessoa cega corresponde a uma reintrodução à cegueira. Mais que mobilidade segura e eficiente, a relação desenvolvida entre humano e animal permite uma outra forma de experienciar o não ver e de estar no mundo, além de propiciar uma reflexão sobre a cegueira que transcende a ideia prevalecente de deficiência como falta (MICHALKO, 1999). Em paralelo, o vínculo entre humano e animal ultrapassa o caráter projetista e instrumental, tornando formas de distinção validadas dentro do paradigma dualista, modelo de interpretação da realidade social caracterizado pela relação dicotômica entre dois domínios distintos (DESCOLA; PALSSON, 2001), insuficientes para compreensão de tal relação. O fenômeno em questão aponta para a eclosão de sensibilidades interespecíficas associadas a benefícios que alcançam dimensões biopsicossociais dos usuários de cães-guia. Nesse contexto, questiona-se quais as mudanças que a presença do animal provoca na maneira de perceber e se relacionar da pessoa cega, e de que forma a função desempenhada por cães-guia e o vínculo estabelecido com o humano operam na ressignificação de sua animalidade, ao mesmo tempo que nos coloca diante de problemáticas específicas, que nos impulsiona a revisitar de forma crítica os princípios metodológicos que guiam o fazer antropológico. Pensando a visão como parte constitutiva do conhecimento antropológico (OLIVEIRA, 2000), como observar relações mediadas por outros sentidos? É nesse contexto que o ensaio proposto se insere, buscando trazer reflexões metodológicas para os estudos sobre relações interespecíficas em interface às trajetórias e experiências de pessoas com deficiência visual.
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Memórias do mundo praticável: narrativas sobre um corpo que não existe mais Autoria: Eudenia Magalhães Barros Autoria: No intuito compreender os sentidos atribuídos em torno da ideia de deficiência, a partir do olhar daqueles que têm sido politicamente reconhecidos e normativamente considerados como pessoas com deficiência, a proposta desse artigo é apresentar alguns achados realizados em campo, oriundos da pesquisa de doutorado, trazidos especificamente das narrativas biográficas de sujeitos que sofreram lesões no corpo, e que tiveram suas rotinas transformadas – pessoas com deficiência adquirida. Aproximo-me dos estudos sobre deficiência e da influência teórica e metodológica dos disability studies, que por sua vez estabelecem fortes diálogos com os estudos feministas, a teoria do reconhecimento fraseana e a teoria crep. Percebo que discursos sobre empowerment e protagonismo ganham destaque nas narrativas tanto dos pesquisadores quanto dos interlocutores deficientes e, não por acaso, os pesquisadores que estudam sobre deficiência lidam com o “assombro da experiência deficiente” e os perigos de não conseguir problematizar politicamente as questões sociológicas sobre a deficiência. Contudo, a biografia desses sujeitos está impressa nas suas percepções analíticas, e posso dizer que, através das narrativas de si, é possível alcançar diferentes formas de compreensão sobre a experiência da deficiência. Por isso, aposto nessa abordagem para entender de forma mais aprofundada quais os dispositivos utilizados pelos sujeitos que vivenciam a transformação dos seus corpos e o impacto disso em uma sociedade capacitista. Tenho disposto, nessa pesquisa, de estratégias metodológicas de cunho qualitativo, priorizando as técnicas de entrevistas abertas, registros de observações nos espaços frequentados pelos interlocutores da pesquisa, elaboração de diários de campo, apoiando-me, sobretudo, nas técnicas da história de vida e relatos de experiência.
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Passos cegos: a percepção dos cegos sobre e pela cidade Autoria: Maria Inês Bacellar Monteiro, Endrius Robert Lopes Autoria: Este texto tem como objetivo apresentar um estudo empírico desenvolvido com três pessoas cegas, com vistas a conhecer como elas percebem a cidade e como são percebidas na cidade. Para isso, realizamos o acompanhamento dos sujeitos em diferentes espaços públicos e privados durante o período de dois anos. Parte-se do pressuposto de que o sentido da visão é extremamente valorizado na sociedade ocidental, a tal ponto que é comum pensar que é necessário ver para conhecer e apreender o mundo. Questionamos essa ideia e procuramos, por meio de uma abordagem etnográfica, identificar outras formas de perceber e formar imagens sem o sentido visual. O estigma da incapacidade surge em diferentes momentos da pesquisa de campo, uma vez que aqueles que se relacionam com os sujeitos cegos, geralmente os veem a partir dos valores da sociedade atual, que coloca a visão como o sentido do conhecimento e, muitas vezes, suas ações revelam piedade frente a condição dos sujeitos cegos. Os cegos por sua vez demonstram dificuldade em modificar esta visão e muitas vezes acabam por assumir uma postura que a reforça. Nota-se que os demais sentidos: audição, tato, olfato, paladar permitem aos cegos um conhecimento peculiar das coisas e do mundo, que mostra a possibilidade de outras formas de conhecimento. Consideramos que entre a imagem e a realidade existem inúmeras possibilidades de significação e que a pessoa cega, por caminhos singulares, com referenciais próprios, narra sobre a cidade e seus espaços a partir dos sentidos que constrói em suas relações sociais.
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Perspectivas do Sul: notas sobre deficiência entre Brasil e África do Sul Autoria: Pedro Lopes Autoria: Esta comunicação tem como objetivo percorrer um levantamento preliminar realizado em um mês de pesquisa na Cidade do Cabo, África do Sul. O objetivo da proposta é pensar sobre diálogos acerca de deficiência – tanto como categoria identitária, quanto administrativa e analítica – entre países do chamado Sul Global. Nesse esforço de mapeamento, procuro situar geopolítica ou talvez etnograficamente as produções e trajetórias de diferentes autoras e autores, de modo a entender como compreensões da deficiência produzem-se em diálogo com cenários globais e enraizamentos locais. Privilegio, portanto, works produzidos e que circulam em redes sul-africanas, tentando organizar um primeiro levantamento experimental do breve tempo de pesquisa de que dispus em Cape Town. O levantamento tenta seguir works antropológicos, mas igualmente aqueles que se organizam pela categoria interdisciplinar Disability Studies. Do ponto de vista de conteúdo, sigo principalmente as pesquisas que procuram sistematizar a trajetória histórica do movimento de pessoas com deficiência na África do Sul e a constituição de um campo disciplinar de pesquisa sobre o tema.
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Tensões e (re)elaborações sobre gênero e deficiência no debate sobre aborto: reflexões etnográficas no contexto da Síndrome Congênita do Zika Vírus. Autoria: Luciana Campelo de Lira, Fernanda Meira de Souza
Roberta Bivar Carneiro Campos Autoria: A Audiência Pública sobre a Discriminalização do aborto até a 12ª semana de gestação realizada pelo Supremo Tribunal Federal em agosto de 2018, ampliou sensivelmente a audiência sobre o debate público travado há décadas no Brasil em relação ao aborto. O tema foi objeto de discussões em outras instâncias, como a Câmara dos Deputados e o Senado Federal, e vem acontecendo nos últimos anos pautado tanto na pressão por parte de grupos e organizações que lutam pelo fim da criminalização das mulheres que praticam o aborto em diferentes circunstâncias, assim como pela sua cobertura assistencial dentro no Sistema de atenção à saúde, quanto por grupos favoráveis a continuidade e mesmo endurecimento da normatização em vigor que criminaliza tal prática. O debate sobre deficiência emerge nesse contexto como elemento central para discussão do tema, tendo em vista o enfretamento de duas narrativas antagônicas, que mobilizam, de um lado, o conceito de eugenia como categoria acusatória contra a descriminalização; e, de outro modo, a partir do engajamento de pessoas com deficiência que dialogam com as bases feministas do movimento pela descriminalização, acionam noções de direito sobre o corpo das mulheres com e sem deficiência e constroem uma narrativa que se contrapõe a tais noções defendidas pelos grupos e organizações chamados de pró-vida. Em meio a esse cenário de discussões, outras tensões emergem nos contextos etnográficos específicos, como os que são objeto desse work, a saber, as mães e cuidadoras de crianças nascidas com a Síndrome Congênita do Zika, especialmente mobilizadas quando da proposta de descriminalização do aborto para mulheres infectadas pelo vírus, colocada em pauta do STF em dezembro de 2016. As especificidades dessa condição e o horizonte moral no qual circulam narrativas que interseccionam feminismo e deficiência, ora contrapondo-se, ora convergindo é objeto desse work. A partir dos dados de pesquisa etnográfica realizada com mulheres mães e/ou cuidadoras de crianças com a SCZ, pretendemos refletir sobre as tensões e proliferações nas ações e discursos desse grupo de mulheres, e as possíveis interfaces entre noções de gênero e deficiência, bem como as implicações possíveis em uma agenda política que (re)elabora a concepção de empoderamento, em sintonia e/ou contrate com os movimentos feministas.
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Visões da Deficiência no Ordenamento Jurídico Brasileiro: Uma etnografia sobre deficientes e sua percepção como custo. Autoria: Enmanuely Sousa Soares, Ricardo da Silva Rodrigues Autoria: Este work faz parte de um projeto de pesquisa sobre acesso à justiça desenvolvido em conjunto com a Defensoria Pública da União em Rondônia. Tem como objetivo realizar um estudo sobre os critérios jurídicos que se entende e se percebe a deficiência no ordenamento jurídico brasileiro. A pesquisa foi desenvolvida na esfera da justiça federal na cidade de Porto Velho-RO no noroeste da amazônia ocidental. De modo específico se estudou o direito a assistência social consagrado na Constituição Federal de 1988 (CF/88) em seu artigo 203, inciso V que assegura a dignidade da pessoa humana dando direito a um salário mínimo mensal a pessoas idosas ou deficientes que estejam em situação vulnerabilidade socioeconômica. Para realizar a pesquisa foram necessárias as seguintes técnicas: estudos bibliográficos, estatísticos e etnográfico. Com isso pode-se constatar que a cidadania e o princípio da igualdade para a pessoa com deficiência é uma construção social desenvolvida e conquistada por indivíduos, instituições públicas e privadas e pelos poderes que compõem o Estado. Identificou-se que a deficiência é vista em duas etapas: a primeira é verificar se a pessoa possui deficiência com impedimento de longo prazo, e a segunda verifica-se se essa deficiência impede sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com os demais. Caso a pessoa portadora de deficiência física, mental, intelectual ou sensorial, seja assim considerada, ela precisará comprovar viver em situação de miserabilidade, que é viver com renda per capita de ½ salário. A etnografia nos revelou que uma pessoa com deficiência acarreta maiores gastos e necessita de maiores cuidados podendo ser necessário que um membro da família deixe de trabalhar apenas para cuidar da pessoa com deficiência o que acarreta maiores gastos e menos rendimentos pois uma pessoa fica fora do mercado de work. Isto provoca um ciclo de pauperização que priva pessoas com deficiência, e o grupo familiar de cidadania plena que inclui o direito à segurança alimentar e nutricional, pois vivem com renda per capita impossível de realizar consumo digno de alimentos e de outros bens e serviços. Este fenômeno socioeconômico produz visões que de os deficientes são um custo.
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“Nada sobre nós sem nós”: Associativismo e deficiência na Síndrome Congênita do Zika Vírus. Autoria: Silvana Sobreira de Matos Autoria: O Estado de Emergência decorrente da epidemia do Zika vírus no Brasil em 2015, impactou de maneira desconcertante, o Estado, os serviços de saúde e assistência social, a pesquisa científica, e as próprias noções de deficiência e Emergência em Saúde Pública. Até hoje a Organização Mundial de Saúde - OMS declarou quatro Emergências de Saúde Pública de importância internacional - ESPII (Gripe A – H1N1, Poliovírus, Ebola) e, diferentemente das demais, a do Zika foi a única que teve como consequência o nascimento de crianças com deficiência, estando a SCZ mais próxima de acontecimentos como a epidemia de Rubéola na Europa e nos EUA nos anos de 1960, e o pânico decorrente da relação entre malformação fetal e o remédio Talidomida.
Neste contexto, esta epidemia é marcada por discussões políticas sobre os determinantes sociais da saúde que envolvem questões econômicas, ambientais, de classe, escolaridade, gênero e sobre a negligência do Estado de Pernambuco e do Brasil em controlar o Aedes aegypti e em promover saneamento básico e fornecimento de água potável. Neste sentido, esta emergência produziu novas precarizações em vidas já vulnerabilizadas pela desigualdade social, recaindo sobre as mulheres pobres, jovens, negras e do nordeste do Brasil o peso maior decorrente desta epidemia.
Com o fim da emergência, em maio de 2017, muitas questões relacionadas a qualidade de vida das crianças com SCZ e de suas famílias ainda precisam ser melhor debatidas. Em decorrência, tem crescido entre as famílias afetadas o empoderamento político através das associações. Atualmente no Brasil existem diversas associações com foco na SCZ e em julho de 2017 foi criada a Frente Nacional Por Direitos das Pessoas com a Síndrome Congênita do Zika Vírus (FNDPSCZ). Estas associações e a FNDPSCZ tem buscado a inserção em diversos espaços (“Nada sobre nós sem nós”) com o intuito de movimentar a discussão sobre políticas públicas de saúde e assistência para a SCZ. Mais uma vez as associações e a FNDPSCZ são formadas em sua maioria por mulheres, mães, avós e tias que para além de debaterem sobre políticas públicas para cuidadoras (es) de pessoas com SCZ, tem ainda levantado o debate sobre as contradições do Benefício de Prestação Continuada (BPC), a formulação de Projetos de Leis sobre pensão indenizatória; as discussões sobre ética em pesquisa; gênero, aborto e reconfigurações familiares em decorrência da epidemia, etc.
A pesquisa Etnografando cuidados (FAGES/UFPE) vem desde 2016 acompanhado as famílias atingidas pela SCZ e neste sentido, o presente artigo busca através da etnografia, discutir associativismo, deficiência e SCZ analisando os principais pleitos e lutas das diversas associações do Brasil e da FNDPSCZ na busca de políticas de cuidado, direitos, cidadania e equidade.
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“Quando você conhece uma pessoa com autismo, você conheceu uma pessoa com autismo”: a construção social do diagnóstico no contexto das políticas de cotas no mercado de work. Autoria: Valeria Aydos Autoria: Este texto apresenta duas questões centrais na inclusão de pessoas com autismo no mercado de work: a necessidade destas pessoas terem um diagnóstico de "deficiência" para o acesso às políticas de cotas nas organizações empresariais, e como este diagnóstico está sendo entendido e vivido nestes espaços. Ao longo de minhas análises, tive como foco a compreensão das formas destas políticas, das relações que produzem, dos sistemas de pensamento em que estão imersas e dos seus efeitos na vida e na construção de subjetividades das pessoas. Neste texto, compartilho parte de meus achados etnográficos que permitiram que eu problematizasse a centralidade do conhecimento neurobiológico e dos
especialistas psi na efetivação desta política, e o caráter (de)subjetivante dos diagnósticos biomédicos. No cenário de um crescente conhecimento da propagação midiática sobre o autismo, a flexibilidade e a complexidade da sua produção como um "diagnóstico clínico" e situado em um espectro (TEA) altamente diversificado, somam-se aos debates sobre esta condição ser uma deficiência ou uma neurodiversidade. Especificamente em minha pesquisa, este debate está contextualizado na presença das pessoas com TEA no cotidiano laboral e nos efeitos das diferentes formas de entender e "habitar" o autismo nestes espaços. Minhas reflexões levam em conta, então, um contexto de propagação de racionalidades e moralidades higienizantes e individualizadoras, presentes na construção de um ideal inalcançável de “trabalhador empreendedor de si”, reforçadas pela exigência de habilidades como flexibilidade, criatividade, pró-atividade e inteligência emocional. Apontam também para a necessidade de repensarmos o "Emprego Apoiado" para as pessoas com as chamadas "deficiências invisíveis". Minha pesquisa mostra, na prática, como os diversos atores e as racionalidades presentes nos processos de inclusão atuam na construção social de novos sujeitos, relações e sensibilidades sociais, assim como na produção das próprias políticas públicas, do mercado de work e da cidadania no Brasil.
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“Se ele sobreviver, vai vegetar” Sobre agência, aprendizado e experiência sensorial entre as crianças nascidas com a SCZV Autoria: Amanda Antunes Autoria: Em 2015 um fenômeno novo afetou especialmente o estado de Recife PE, se tratava da epidemia da síndrome congênita do Zika Vírus. Um grande número de nascimento de crianças com microcefalia foi constatado e junto com esse diagnóstico os médicos davam suas sentenças vagas e negativas: “se ele sobreviver, vai vegetar”. Essa foi uma frase frequente que as mães das crianças nascidas com síndrome ouviram dos médicos no primeiro momento do surto, frase essa que retirava toda a possibilidade de agenciamentos das crianças, bem como as projeções para o futuro delas. Durante esses três anos, no entanto, os bebês parecem surpreender os médicos e as instituições, pois a cada novo ano de vida desafiam essa sentença, demonstrando suas possibilidades de agência. Ao mesmo tempo, as mães –principais cuidadoras dos ‘bebês de micro’ - tanto aprendem algo novo com seus filhos, quanto ensinam aos médicos e instituições diversas a potencialidade de suas crianças. E as mães, por sua vez, também demonstram suas agências tanto em como elas entenderam o diagnóstico de microcefalia, a deficiência e especificidade de seus filhos e os cuidados práticos cotidianos. Elas aprenderam com seus filhos a lutar por seus direitos, circular pela cidade, questionar cuidados e orientações médicas; avaliar instituições e cuidados médicos, entre outros. E ensinam às instituições que seus filhos têm vontades próprias, que eles podem, por exemplo, gostar ou não de uma terapeuta, de um método terapêutico; elas também aprenderam no cotidiano com seus filhos quais os efeitos práticos dos remédios e passam tais informações para os médicos. Nesse sentido, os bebês parecem estar provocando transformações em suas mães, bem como nas instituições. Dessa forma, a opinião médica não foi/é a única versão dos fatos, tampouco a única verdade a ser seguida, ela pode ser questionada, analisada e desafiada pelas mães e crianças. Esse artigo busca analisar como a categoria de agência pode ser mobilizada no contexto da deficiência focando nas experiências dos afetados pela SCZV, bem como quais são as limitações de agência vivenciadas pelas mães e crianças afetadas pela epidemia.
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