GT 017. Antropologia das Relações Humano-Animal
Andréa Barbosa Osório Sarandy (UFF) - Coordenador/a, Flávio Leonel Abreu da Silveira (UFPA) - Coordenador/aResumos submetidos |
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"Cidade moderna não é lugar de bicho": reformas urbanas e a repressão aos usos rurais no Rio de Janeiro (1903-1910) Autoria: Leonardo Soares dos Santos Autoria:
Neste work examino as transformações urbanas do Rio de Janeiro durante os anos em que Pereira Passos esteve a frente da administração municipal (1903-1906), em especial as que afetaram a relação rural-urbana que se desenvolvia na cidade. Ela era um dos cernes do sistema de abastecimento de gêneros que servia às necessidades da sua população e que remonta ao período colonial. A pesquisa trata, portanto, de um período que o perímetro urbano passa a ser exclusivamente um espaço do consumo. E não mais de produção de alimentos. Assim, analiso como a alteração sobre a leitura que se tinha sobre os antigos arrabaldes (que passa a ser visto como subúrbio) está intimamente relacionada a um processo de ocupação dessa região por grupos sociais que tradicionalmente habitavam as áreas menos valorizadas do perímetro urbano de ocupação mais antiga. Fenômeno este que, de alguma maneira, era captado pelos literatos que utilizavam o Rio como cenário de suas histórias. Mas a mudança sobre a leitura do espaço do subúrbio e da região central não esteve ligada apenas à questão dos grupos sociais que ali se estabeleciam: a relação com determinados animais também foi impactado pelas reformas urbanas. O que procuro demonstrar, a partir dessa situação, é que a modificação do perfil social de vários territórios da cidade teve importantes implicações no convívio das pessoas com alguns animais nesses espaços. E isso se daria principalmente pelo lado negativo: a criação de animais como vaca, boi, galinha, cabrito e porco passou a ser proibido. E tal proibição foi abalisada pelas novas representações então forjadas sobre o centro da cidade, por exemplo. A cidade moderna e "europeia" não deveria, segundo seus intelectuais, comportar hábitos "tão rurais". |
A inter-relação existente entre vaqueiro-cavalo-boi na região sudoeste do Piauí: importância, consequências e diferenças Autoria: Manuela Ribeiro dos Santos Assis Autoria: O artigo em questão aborda a relação entre vaqueiro, seu cavalo e o gado no seu work de aboio, na região sudoeste do estado do Piauí, na macrorregião do município de São Raimundo Nonato. Tendo como eixo central a temática das relações humano-animal, a fundamental contribuição deste artigo é demonstrar que o vaqueiro dessa região mantém uma relação harmônica e afetuosa e não apenas de preponderância e repressão entre o seu cavalo e o gado bovino, e que não está ali apenas para reprimi-los à violência física. Assim, através de entrevistas semiestruturadas com vaqueiros de variadas faixas etárias, buscamos compreender como se dar a relação vaqueiro-cavalo e vaqueiro-boi, para apontar a importância dessa relação tanto no âmbito emocional, cultural e econômico para a região.
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A Leishmaniose Visceral e a saúde única Autoria: Adriana Leal Abreu Autoria: A Leishmaniose Visceral é considerada pela OMS a 6ª zoonose em grau de importância por sua amplitude de acometimentos e crescimento de números de casos em nível mundial. Cerca de 300.000 novos casos em âmbito mundial ao ano, conforme WHO (2012) e mesmo assim inexistem políticas públicas brasileiras para contenção da doença. No estado do Rio Grande do Sul, onde os casos iniciaram a partir de 2010, nem o diagnóstico da doença nem seu tratamento são seguramente conhecidos. No âmbito do que se designa como saúde única pela OMS, que é o tratamento conjunto e em políticas públicas inter-relacionadas de saúde humana, saúde animal e meio ambiente, o estado do Rio Grande do Sul não possui evidências que estas práticas ocorram. Existem alguns municípios como o caso de Canoas, Porto Alegre até o ano de 2017 e Viamão, por exemplo, que possuem ações isoladas de educação ambiental em parceria com escolas municipais, programas de castrações e contenção de população de animais em situação de rua, e distribuição de coleiras repelentes, além de escassas são ações de governo e não estão inseridas em práticas institucionais de longo prazo, como estratégias de saúde coletiva. Segundo Oliveira, Moretti-Pires, Parente (2011), a Estratégia de Saúde da Família serviu para fortalecimento da Atenção Primária e descentralização das responsabilidades nas três esferas, objetivando alcançar maior efetividade, eficiência e qualidade das respostas aos usuários. Esperava-se também que com as equipes multidisciplinares, e com o ingresso de várias especialidades na composição destas equipes, os works preventivos e de contenção de zoonoses e outras enfermidades pudessem se intensificar. Entretanto, quando analisadas via sistema DataSUS a composição das Equipes de Saúde da Família existentes no estado do Rio Grande do Sul, sobretudo no município de Porto Alegre, não se observou a interdisciplinaridade requerida pela ideologia de saúde única. Em 2011, por meio de portaria as ESFs foram encorajadas a compor seus quadros com médicos veterinários, para que a prevenção no local de habitação das famílias pudesse ser efetiva. Observou-se a completa inexistência destas especialidades no município de Porto Alegre, sendo este escolhido por registrar casos de morte por Leishmaniose Visceral de acometidos humanos, totalizando 6 vítimas desde a primeira notificação em 2011 até o ano de 2018, mais precisamente janeiro deste ano. Com este estudo preliminar pode-se concluir que práticas de prevenção e controle da doença ainda estão muito aquém das necessidades. Visualizou-se também que mesmo que o município de Porto Alegre tenha, mesmo que pouca, mas alguma ação de prevenção, os municípios da Região Metropolitana não agem na prevenção da doença nem em humanos, nem em animais.
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A pesca do boto Autoria: Olavo Ramalho Marques Autoria:
Neste work, apresento uma pesquisa etnográfica acerca das práticas dos pescadores artesanais na chamada “pesca do boto” ou “pesca com o boto” na Barra do Rio Tramandaí – modalidade de pesca em que lançam mão de tarrafas (redes circulares) e pescam tainhas em conjunto com os golfinhos-nariz-de-garrafa, popularmente chamados de botos pela população local. Este work é produzido em meio a um amplo projeto de pesquisa e extensão realizado por uma equipe composta, entre professores e estudantes de graduação e pós-graduação, por biólogos, cientistas sociais, geógrafos e profissionais da área do desenvolvimento. Apresenta-se aqui considerações sobre tal prática a partir da produção imagens em vídeo visando à construção de um documentário etnográfico que valoriza as narrativas, os saberes e percepções ambientais de pescadores artesanais, em suas relações com os botos. A pesca, reconhecida como “pesca cooperativa”, se dá onde a foz do rio Tramandaí junto ao Oceano Atlântico compõe um estuário que delimita a fronteira entre Tramandaí e Imbé, municípios do Litoral Norte do Rio Grande do Sul/Brasil e que fazem parte da rede urbana reconhecida oficialmente como Aglomeração Urbana do Litoral Norte. Cenário sui generis que condensa as características territoriais do Litoral Norte - em termos de tecido urbano, densidade habitacional, verticalização das construções, planos de desenvolvimento urbano, sociabilidades e usos para turismo e lazer -, a Barra se configura como fronteira física e simbólica entre as cidades. São cidades pequenas, com processos acelerados de transformação urbana e marcadas por uma ocupação sazonal muito diferenciada, já que a região atrai milhares de turistas e veranistas vindos da capital e outras regiões do estado nos meses de verão, nos quais a população total pode chegar ao triplo da população permanente. Nesse contexto, a pesca da tainha envolve técnicas e saberes que atravessam gerações de pescadores (e botos). Os pescadores, em suas narrativas biográficas, remontam a memórias e trajetórias de vida que conduzem à compreensão de uma singularidade identitária enquanto grupo – são pescadores artesanais “de tarrafa”, que pescam “com o boto” – e enquanto portadores de saberes únicos: quanto aos botos (seu comportamento, suas relações intergeracionais, suas reações quanto às ações humanas), bem como quanto ao ambiente (seus ventos, marés, ciclos das águas) e suas transformações, especialmente quanto aos problemas e conflitos envolvidos nas dinâmicas sazonais e no crescimento urbano. Assim, em termos da projeção de futuros, ganha especial relevo em suas reflexões uma dramática em torno das (im)possibilidades de perpetuação desta prática. |
Aprendendo a conviver com os tubarões: Relações entre humanos e não humanos no arquipélago de Fernando de Noronha (PE). Autoria: Rayana Mendonça do Nascimento Autoria: Em 2015 ocorreu o primeiro ataque de tubarão no arquipélago de Fernando de Noronha, uma das maiores reservas marinhas do Brasil, que faz parte de Pernambuco, estado com o maior número de ataques de tubarões registrados. No ataque que ocorreu na Baía do Sueste, o turista estava realizando um mergulho quando foi mordido, perdendo a mão e parte do antebraço direito. Um ano depois, outro turista foi atacado por um tubarão na Praia do Leão, obtendo um ferimento superficial na perna. Outros dois incidentes entre turistas e o animal selvagem foram registrados nos anos decorrentes, um no ano de 2017 quando uma turista retirou um filhote de tubarão-limão do mar para fazer fotos e vídeos com o animal, ela levou uma mordida na mão e no inicio de 2018, um surfista de vinte anos que visitava o arquipélago, caiu encima de um tubarão ao se desequilibrar da prancha e levou quinze pontos no braço. Os especialistas e pesquisadores do Instituto Tubarões e do Instituto Chico Mendes da Biodiversidade (ICMBio),acreditam que o crescimento do número de turistas e surfistas que visitam a ilha é tido como o principal fator para a propensão de ataques e incidentes com os tubarões. A partir de uma perspectiva antropológica dessa recente relação entre os humanos e os animais não humanos, essa pesquisa tem como objetivo analisar a agência dos sujeitos, isto é, turistas, surfistas e tubarões, e as transformações culturais e econômicas decorrentes desse convívio no arquipélago de Fernando de Noronha.
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Aprendendo a manipular animais na prática científica Autoria: Iara Maria de Almeida Souza Autoria: A experimentação com animais, em especial com camundongos, é crucial para a pesquisa biomédica. Ao ingressarem nos laboratórios, essas criaturas foram convertidas em componentes altamente padronizadas e, de modo correspondente, o work prático para lidar com elas foi normatizado. Tendo isto em conta este artigo pretende explorar as formas de aprendizado técnico e aquisição de habilidades para o manuseio de animais na experimentação que tem lugar em uma instituição pública de pesquisa em biomedicina. Pesquisadores que atuam na instituição recebem dois tipos de formação: 1. fazem um curso teórico em que são instruídos – por meio de palestras e vídeos – sobre biossegurança e sobre as técnicas corretas de manipulação de roedores, 2. são iniciados na prática experimental tendo como guia um pesquisador mais experiente, em um tipo de aprendizado que implica uma educação da atenção, ou seja, em uma exploração perceptiva e ativa dos modos de tocar e manusear os animais, monitorando as suas respostas à manipulação. Ao tratar dessa aprendizagem dois pontos são ressaltados, por um lado, mostro que a aquisição da habilidade não envolve apenas um saber passado de um humano a outro, mas o corpo e os movimentos dos bichos também ensinam sobre o modo como o work deve ser conduzido. De outro lado, chamo a atenção para o fato de que o aprendizado, embora se oriente para a uniformização, na prática sempre se mescla a invenções e singularizações.
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Caprinocultura e família no sertão de Pernambuco Autoria: Ariane Vasques Zambrini Autoria:
A caprinocultura é uma atividade pecuária comumente realizada nas regiões semiáridas do Brasil. No sertão de Pernambuco é comum que se criem cabras e bodes na solta. Este criatório, para que seja realizado com eficácia, exige uma série de técnicas e procedimentos, dentre eles, os sinais, que são recortes feitos a faca nas orelhas dos animais e indicam, simultaneamente, uma propriedade individual e uma pertença familiar. Por meio dos sinais é possível compreender as relações entre um modo de criação animal e uma noção específica de família. Pretende-se, desse modo, descrever as relações que são tramadas entre humanos e animais nessa região e que evidenciam não só um modo peculiar de criação animal, mas um modo de se fazer e manter família. |
Coabitar: relações entre humanos e tubarões nas praias de Recife e Região Metropolitana de Pernambuco/Brasil Autoria: Ana Cláudia Rodrigues da Silva Autoria: Incidentes entre humanos e tubarões ocorrem em vários lugares do mundo. No Brasil, as praias que registram maior número de incidentes (ataques), estão localizadas no estado de Pernambuco, mais precisamente em Recife e Região Metropolitana. Oficialmente o Estado registra 65 casos, com 27 vítimas fatais. Em 2018 ocorreram dois incidentes na praia de Piedade, com intervalo de menos de dois meses. A cada incidente, as relações entre os humanos e os animais (tubarões) são reconfiguradas a partir de uma complexa rede de ações, que envolvem o Estado e as políticas públicas de mitigação dos incidentes, os usuários das praias, ativistas e ambientalistas, pesquisadores e as várias espécies de tubarões que habitam esse ambiente. O “encontro” entre pessoas e tubarões demanda esforços e disputas em torno da melhor forma de coabitar as praias. Na década de 1990, quando houve aumento dos números de incidentes, as pessoas viam o animal como o algoz, o monstro que vinha às praias para atacar os humanos. Hoje, cada vez mais, circula o discurso de que “o tubarão está em seu habitat, é o humano que invade seu espaço”. A melhor maneira de lidar com essa relação não é consenso; alguns humanos defendem a instalação de redes de proteção nas praias para evitar o acesso do animal as águas rasas, outros são a favor da interdição das praias para banho e alguns demandam políticas ambientais mais efetivas. Este work, pautado nos estudos antropológicos sobre as relações interespecíficas, busca entender a negociação em torno dos usos de espaços urbanos entre humanos e animais selvagens, a partir das diversas agencias envolvidas nessa relação, e, principalmente, refletir sobre as possibilidades e limites de uma co-habitação nas praias de Pernambuco. Para esta reflexão, são acionados conceitos com coabitar, ambiente e devir animal, presentes em discussões apresentadas, por exemplo, por autores como Tim Ingold, Descola e outros.
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Doença, martírio e extinção: Sobre as relações entre humanos e macacos-prego mediadas pelo surto de febre amarela no Brasil Autoria: Eliane Sebeika Rapchan Autoria:
O objetivo dessa reflexão é tratar do lugar que as abordagens sobre animais e sobre as relações entre humanos e animais têm ocupado na antropologia contemporânea, a partir das categorias “semelhança” e “diferença” em relação aos fenômenos associados à saúde e à doença. Para isso, pretende-se analisar o caso particular das ações populares frente ao surto de febre amarela no Brasil em 2018 que, ao associarem o contágio pela doença aos macacos-prego, promoveram ataques violentos e mortes dos animais. Tal análise pretende explorar alguns dos caminhos trilhados na constituição de categorias como natureza, cultura e natureza humana, bem como as brechas existentes nessas categorias, para tratar da desconstrução do sujeito unitário e racional, projeto do pensamento moderno ocidental, buscando outros caminhos, que sugerem reflexões transversais, a partir da crítica aos processos de subordinação entre categorias de pensamento pré-fixadas e a fim de explorar os mecanismos de emergência e tratamento teórico da produção histórico-social das concepções de humano e de animal. |
Domesticação dos humanos por meio dos afetos: uma observação da contribuição das redes sociais virtuais nesse processo. Autoria: Evelyn Marcele Ribeiro Mota Autoria: Trata-se de uma etnografia do movimento social de cuidados e proteção animal na cidade de Aracaju, estado de Sergipe, com foco nas articulações por trás da realização de campanhas visando à coleta de ração, feiras de adoção de cães e gatos e o combate aos maus tratos de animais domésticos, ações que, possibilitadas através de agenciamentos feitos no facebook e instagram, vêm contribuindo significativamente para a conscientização e expansão do direito animal nesta cidade. O acompanhamento das atividades da Anjos por meio das redes sociais possibilitou o mapeamento das pessoas e instituições envolvidos nessa rede de relações. Já que, às redes sociais virtuais é o principal meio que as ONGs de proteção animal têm para se articular, manter um diálogo e ampliar a divulgação de seus works, o acompanhamento dessas atividades é de extrema importância para a analise.
Verificamos que o work realizado pela Anjos utiliza de uma linguagem de forte apelo emotivo voltado para a compaixão por cães e gatos abandonados, frases como “Ajude a anjos a salvar mais vidas” tem em vista a aproximação do animal doméstico por meio da empatia, construindo esse animal como um ente humanizado, mais próximo de nós e merecedores de proteção. É por meio dos afetos despertados na relação humano e não-humano que ocorre o canal de comunicação, é o despertar dessa afeição que vemos tomar conta de muitos humanos a favor da causa animal. Trazer para o debate a relação humanos e não-humanos sob diversas perspectivas é, principalmente, observar como há construções dessas relações por meio dos afetos, da linguagem e da aproximação.
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Esses bichos são muito inteligentes! A noção e a previsão Autoria: Lucas Lima dos Santos Autoria: A previsão do tempo transmitida diariamente em rádios e televisões é corriqueiramente motivo de muitas discussões entre os habitantes da vila do Pontal do Leste (extremo sul da Ilha do Cardoso, Cananeia, SP). A trivialidade pode ser compreendida, já que a vila é composta por muitos pescadores e as análises das condições do tempo são de extrema importância para as práticas pesqueiras. Para que os praticantes tenham sucesso na pescaria é necessário todo um envolvimento com as paisagens multiespecíficas locais. É através de peculiaridades comportamentais de animais não-humanos e determinados tipos de ventos que pescadores conseguem afinar as suas “noções do tempo”. “Noção” e “previsão” são duas categorias locais que se divergem, mas com alguns pontos de afinidade. Animais não-humanos – principalmente aves, insetos e alguns primatas – conseguem adivinhar as condições futuras do tempo e é através de algumas modalidades etológicas, processos eólicos e sazonais locais, que pescadores conseguem se planejar e realizar as suas práticas. Essa proposta de apresentação oral gostaria de expor como as projeções futuras das condições do tempo – oriundas das relações entre humanos e animais não-humanos – são desenvolvidas, permitindo o afinamento das noções do tempo dos pescadores da vila. Contudo, o objetivo é ainda descrever como essas noções geram aproximações e afastamentos com as previsões do tempo transmitidas pelos meios de comunicação. Se por um lado as noções são passadas e moldadas entre gerações de pescadores, através das participações em determinados processos locais com animais não-humanos, ventos e sazonalidades; como as previsões produzidas por meteorologistas, através de mensurações vinculadas aos conhecimentos científicos, adentram nos espaços da vila?
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Etnografia multiéspecies no Parque Zoobotânico do Museu Paraense Emilio Goeldi (Belém - PA) Autoria: Matheus Henrique Pereira daSilva Autoria:
A presente proposta trata de uma etnografia em curso no Parque Zoobotânico do Museu Paraense Emilio Goeldi, localizado na cidade de Belém (Pará – Amazônia), que objetiva descrever a rede de relações entre os profissionais ligados a Equipe da Fauna (Tratadores, técnicos, biólogos e médicos veterinários) e os animais que compõe as coleções do museu, com intuito de tornar visíveis as agências de ambos diretamente inter-relacionadas a temática da conservação da biodiversidade em tempos de extinção em massa das espécies, ou seja, se discute o papel e a aliança da ciência, dos agentes e da instituição na era do nomeado Antropoceno. O parque é o mais antigo do Brasil e fundamental na formação de elementos da identidade paraense com o intuito de conservar os ecossistemas amazônicos, onde se encontra uma parcela representativa da riqueza da fauna e flora locais, sendo que a maioria das espécies se encontra ameaçadas de extinção. Na coleção faunística se encontram seis espécies ameaçadas de extinção: a anta, a ariranha, a onça-pintada, a arara-azul, a ararajuba e o gavião-real. Além das coleções naturais o visitante tem a oportunidade de conhecer os monumentos em homenagem a personagens da ciência na Amazônia, bem como uma grande coleção florística. Portanto, a partir do acompanhamento cotidiano das atividades e práticas dos profissionais em termos de cuidado, ética, bem-estar animal e/ou técnicas de enriquecimento alimentar e ambiental se busca conhecer e descrever os aspectos sociais da convivência multiespecífica no parque, no que se refere às coleções, bem como suas redes de divulgação científica (websites, eventos, exposições no local, etc.) ligadas à conservação da biodiversidade amazônica. Além disso, as práticas de convivência entre os trabalhadores e os animais nos permitem repensar o “campo” enquanto locais de encontros multiéspecies (DOOREN et al, 2016), formando a base de novos conhecimentos sobre outras espécies e possibilidades de elaboração de vidas compartilhadas em tempos de extinção. Referências Bibliográficas DOOREN, T. van; KIRKSEY, E.; MUNSTER, U. Multispecies Studies Cultivating Arts of Attentiveness. Environmental Humanities, V. 8, N. 1, p. 1-23, 2016. |
História de onça: um exercício de etnoecologia simétrica Autoria: Felipe Sussekind Viveiros de Castro Autoria: A palavra “onça”, em português, designa em geral duas espécies diferentes de felinos, bem diferentes entre si em termos biológicos: a onça-pintada, ou jaguar (Panthera onca) e a onça-parda, também chamada de puma, ou suçuarana, entre outros nomes populares (Puma concolor). Esta apresentação tem como referencial empírico uma experiência etnográfica realizada em fazendas do sul do Pantanal, envolvendo uma série de depoimentos e entrevistas de vaqueiros e moradores locais. O que se propõe investigar é o modo como as onças são classificadas e descritas, tanto em termos de suas relações entre si quanto em termos de suas relações com os seres humanos. Neste ponto, chama atenção o modo como a descrição local está ligada ao mundo vivido dos vaqueiros, envolvendo articulações, muitas vezes ambíguas, entre o manso e o brabo, o doméstico e o selvagem. Características físicas (elementos cromáticos), comportamentos e hábitos de cada espécie se articulam, neste caso, em percepções complexas do ambiente e do mundo social. Uma referência importante para este work, em termos teóricos, é a análise que Lévi-Strauss faz das narrativas míticas envolvendo os personagens do lince e do coiote cem História de Lince, com a ideia de um par de opostos formulada nos termos de um dualismo em perpétuo desequilíbrio. Pretende-se abordar também a simetria entre as o papel socioecológico das onças nas narrativas pantaneiras, de um lado, e na literatura conservacionista, de outro, tomando como referência, neste caso, a noção de antropologia simétrica tal como formulada por Bruno Latour, e buscando refletir sobre a interação entre saberes tradicionais e conhecimentos científicos.
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Humano e algumas espécies da fauna no conhecimento ambiental empírico do povo Xerente Autoria: Valcir Sumekwa Xerente, Dr. Odair Giraldin Autoria:
RESUMO Os Akwẽ (Xerente), pertencem ao troco Macro-Jê, família linguística Jê Centrale tem semelhança com as línguas Xavante e Xacriabá. Durante o contato com os europeus, parte dos Akwẽ tiveram a experiencia de viver no aldeamento de São José do Duro (atual Dianópolis-TO). Parte dos Xavante passaram pela experiencia de viver no aldeamento do Carretão (atual Rubiataba-GO), mas eles se deslocaram para estado do Mato Grosso, fugindo do contato. Já os Xacriabá se deslocaram para Minas Gerais. Os Akwẽ continuam entre os rios Tocantins e Sono, no Estado do Tocantins. A sociedade Akwẽ ainda depende muito das disponibilidades da fauna e do conhecimento ambiental a partir da sua cosmologia. Segundo os anciões das aldeias, antigamente havia a caçada e pescaria individual ou em grupo para utilizar como alimento dos dias cotidianos. Os caçadores e pescadores eram orientados pelos anciões e pajés para evitar interferências danosas nas interações das espécies da fauna. Eles também falam que a caçada e pescaria coletivas eram realizadas quando necessário para mantimentos durante atividade cultural como ritual de nominações masculino, feminino ou para as nomeações realizadas para exercer algumas função importante na sociedade. Mas para esta atividade é preciso ter grande extensão do território, por isso, nos dias atuais as atividades culturais não são realizadas completamente como ara antigamente antes da demarcação da terra Xerente. Os Akwẽ estão muitos ligados à cosmologia e precisamos recorrer a ela para entender melhor e interpretar as interações das espécies da fauna e meio ambiente. No conhecimento ambiental Akwẽ, o surgimento das espécies da fauna e também como se interagem no meio ambiente, está ligada em algumas seres invisíveis e que são explicadas na cosmologia. Existem espíritos que governam seres vivos no ambiente das florestas e cerrados, aos quais os Xerente denominam como kâtdêkwa (espíritos que governam seres vivos do ambiente aquático), mrã tdêkwa (espíritos que governam seres vivos do ambiente da floresta e cerrado). Segundo anciões Xerente quando a área de nascente de água é degradada pela ação de um indivíduo humano, a sucuri (kâtdêkwa) abandona seu habitat, resultando no secamento de água da nascente. Para os Akwẽ, quando formações florestais, matas ciliares e de galerias são removidas pelas máquinas ou para uso como pecuária, algumas romhêibakõ (coisa que não possuí corpo visível, que podem ser chamados de kâtdêkwa e mrã tdêkwa) vão embora furiosos levando consigo espécies da fauna para longe dos seu habitat. |
Notas etnográficas sobre relações multiespécies no semiárido Autoria: Gabriel Holliver Souza Costa Autoria:
“Quem tem gado é escravo dele” foi uma frase que muito ouvi de meus amigos.Vacas, ovelhas, cabras, porcos, galinhas são animais de criação e exigem cuidado diário tanto no período da chuva quanto no período da seca. Os animais consomem o tempo dos agricultores, é preciso tirar o leite, colocá-los para pastar, recolher a noite para o curral, e inclusive boa parte da agricultura é direcionada para alimentar esses animais. Situados no Médio Sertão da Paraíba, em meio a um regime de sazonalidade rigorosa onde chove-se por cerca de três meses, agricultores autodenominados por “experimentadores” tecem relações com seus animais de criação e com outros animais silvestres que habitam em seus sítios. No roçado também habitam animais, raposas, cobras, camaleões e insetos que interagem com plantas e humanos. Um plantio de arroz serve como exemplo de um emaranhado multiespécie, o pardal faz seu ninho na própria planta, garças ali se alimentam, sapos, lagartas, baratas d’água, ratos, cobras, sanguessugas habitam o chão, enquanto no alagado vivem peixes. Os movimentos dos animais são ainda fonte de conhecimento, muitas das “experiências” que produzem previsões climáticas acerca da possibilidade e da intensidade das chuvas no período de inverno se baseiam no comportamento de animais para produzirem seus diagnósticos. Animais servem para ser criados, comidos e caçados. Podem também ser protagonistas de transformações revolucionárias, como se deu no fim da década de 1980 com o surgimento de um inseto conhecido popularmente na região como o bicudo. Este nunca antes visto na região, provocou fim a hegemonia do sistema de plantation que dominava e sustentava a economia local a partir do cultivo de algodão . Esse animal, assim como outros, Nem sempre desejáveis, fazem parte das relações multiespécie e em muitos casos são fontes de conhecimento. Neste ensaio através de histórias que presenciei e outras que ouvi busco tecer notas acerca das relações com espécies companheiras e espécies de companhia com que se engajam agricultores familiares camponeses que habitam o médio sertão. |
O que a corrida de touros andamarquina pode nos dizer sobre as relações entre humanos e animais nos Andes peruanos? Autoria: Indira Nahomi Viana Caballero Autoria: A corrida de touros figura como um importante acontecimento em Andamarca (departamento de Ayacucho, Andes peruanos), muito esperada por todos a cada ano. A atração faz parte das atividades da Festa da Água, a maior e principal celebração local realizada sempre em agosto, início do ano agrícola. Trata-se de um ritual herdeiro de duas tradições associadas ao que alguns chamariam de violência: no caso das corridas espanholas, isso aconteceria com a morte do touro ou, eventualmente, do toureiro; e no caso das corridas andinas peruanas, também conhecidas como Yawar Fiesta (Festa de Sangue), os ferimentos envolveriam touros e condores, uma vez que estas imponentes aves são amarradas ao lombo dos primeiros. Cabe destacar que essas últimas foram se tornando cada vez mais raras ao longo da segunda metade do século XX, sendo raríssimas nos dias de hoje. Em diversos povoados altoandinos o que se vê atualmente é uma transformação de ambos os estilos de corrida em um evento que desperta sobretudo o riso, não havendo mortos nem feridos. O objetivo deste work é realçar alguns aspectos relacionados a tais rituais, tanto da Festa de Sangue como das corridas contemporâneas a partir de dados oriundos de pesquisa etnográfica em Andamarca, na medida em que possam ser reveladores das relações entre humanos e animais nos Andes peruanos.
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O USO DO MODELO ANIMAL NA CIÊNCIA: sua descrição nas publicações acadêmicas e a prática experimental Autoria: Jackeline da Silva Jeronimo de Souza Autoria:
Este work tem como objetivo comparar o modo como o uso do modelo animal, especialmente camundongos, ratos e hamsters, é descrito na literatura científica- através da análise de artigos publicados em periódicos acadêmicos - e as práticas de manipulação realizadas por pesquisadores atuando em um biotério de uma instituição pública de pesquisa na área biomédica, tal qual relatados em entrevistas abertas sobre o seu work. A relevância desta temática quando consideramos que o uso de roedores em pesquisa é fortemente presente nas investigações biomédicas. Eles representam a maior parte dos animais dos experimentos, portanto, o novo sentido atribuído à relação entre o pesquisador e os meios da investigação – seres vivos – deve transparecer no produto final da pesquisa: as publicações cientificas. |
ONTOLOGIAS E SERES DA NATUREZA: as existências ameríndias e suas políticas Autoria: Antonio Augusto Oliveira Goncalves Autoria: Neste texto, pretendo seguir algumas linhas de reflexão suscitadas pelo giro ontológico na antropologia. A questão que move o presente work é: o foco dessa vertente no processo de produção de seres, cosmologias, afecções, em cindir dualismos e buscar “outros mundos possíveis” (VIVEIROS DE CASTRO, 2008b), se mostra pouco preocupada com os ímpetos, sejam políticos, econômicos e as relações de poder, que constrangem esta viagem rumo ao pensamento ameríndio?
Em termos gerais, a antropologia ontológica problematiza os princípios ou coordenadas básicas nos modos de conceber o mundo e as relações entre os viventes, sejam eles humanos ou não. A premissa da multiplicidade faz com que a ideia de que há um único mundo com distintas representações sobre ele seja substituída pela existência de múltiplos mundos, cindidos por diferenças radicais. Com isto, defende-se a alternativa de que existem outras realidades que nós não acessamos por conta dos nossos quadros conceituais (TOLA, 2016). Não é por acaso que Holbraad (2014) defina o giro enquanto uma intervenção metodológica, porquanto é apenas através da etnografia que nós podemos acessar a esta diferença radical e simultaneamente deturpar as nossas categorias, revendo os limites do nosso aparato conceitual em aprender com ela. Além de suspender e redefinir certos conceitos, como a de mundo, crença, representação e identidade, os/as principais expoentes desse campo tendem a questionar os divisores modernos e as oposições binárias do Ocidente e talvez seja, justamente, esta posição teórica fulcral que permita aproximar linhas de pensamento de autores/as tão distintos/as tais como Roy Wagner, Marilyn Strathern, Bruno Latour, Eduardo Viveiros de Castro e Tim Ingold.
Ao longo deste work, almejo enfocar nos textos de ontologistas no âmbito nacional, proponho assim rever algumas ideias de Mauro Almeida (2013), e, além disso, não posso me furtar de perquirir os escritos daquele que é considerado um/a dos/as precursores/as do giro ontológico no Brasil, Viveiros de Castro (2006; 2008a; 2008b; 2015).
Entretanto, antes de embrenhar-me nas matas ameríndias ou suspeitar da presença de “Caipora” no Alto Juruá, farei uma breve visita a Madagascar, na qual pretendo refletir sobre a teoria do contrapoder imaginário de David Graeber (2011). Independente da proximidade e/ou distância de Graeber em relação aos/às ontologistas no Brasil, buscar esta saída pela tangente serve para calibrar a minha pergunta no início deste resumo: será que a aposta ontológica nas multiplicidades necessariamente despolitiza? Os dados etnográficos e as categorias de cada um destes autores provavelmente devem deslocar a minha indagação para diferentes matizes políticos.
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OS GATEIROS DO PARU: Uma análise das mudanças na forma de interação entre humanos e animais no contexto da caça praticada em Almeirim-PA, entre as décadas de 1960 e 1970. Autoria: Carlyle Oliveira Martins Autoria:
Este work aborda o uso de recursos naturais de livre acesso, utilizando como fonte privilegiada de informações as narrativas de gateiros, termo utilizado para referir aos antigos caçadores de onça que habitam a região do rio Paru, município de Almeirim, estado do Pará. O objetivo é identificar e caracterizar o processo relacionado às mudanças nas formas de uso da fauna silvestre, os principais agentes envolvidos nesse processo, as formas de interação com esses animais; conhecimentos; técnicas e as habilidades envolvidas. Parto dessas observações para refletir a naturalização dos conceitos de “natureza” e “cultura” e considerar, ao mesmo tempo, novas experiências em torno dessa relação entre humanidade e animalidade A hipótese apresentada nesse work é de uma malha de sociabilidades que resultaram em mudanças no plano moral-cultural (ou seja, dos valores que orientam a relação homem natureza), favoreceu o surgimento de práticas e ideias sobre regimes de apropriação dos recursos de acesso livre, onde se confrontam também códigos morais-culturais e sociabilidades várias. Para elaborar a análise realizo um estudo empírico qualitativo sobre a atividade da caça comercial que ocorreu nessa região no período situado entre a década de 1960 e 1970, quando a caça para comercialização do couro da onça se tornou a principal atividade geradora de renda dos extrativistas da região que, até então, tinham como principal fonte de subsistência a atividade de coleta de produtos florestais. |
Parque dos Falcões: aves e humanos no espaço da linguagem Autoria: Beto Vianna, Fernanda Batista dos Santos Autoria: No Parque dos Falcões, localizado no município de Itabaiana, Sergipe, são acolhidas aves de rapina com uma história de maus tratos ou apreendidas no tráfico de animais silvestres. Além de santuário e centro de educação ambiental, o parque tem como fonte de renda a prática da falcoaria, utilizada como sistema de controle biológico. Chamam a atenção do visitante, as regularidades comportamentais na interação entre cuidadores e animais, mesmo as espécies tipicamente mais arredias ou os indivíduos mais traumatizados. Os guias do parque explicam parte do comportamento adaptável das aves pela noção, padrão em etologia, de imprinting. O conceito, aplicado aos processos cognitivos e de aprendizado nas aves, ecoa o princípio da parcimônia de Lloyd Morgan, corrente no discurso científico. No entanto, a observação da dança comportamental entre aves e cuidadores abre a possibilidade de descrições alternativas, colocando em questão o princípio explicativo em que padrões fixos de ação são postulados para o animal, e unilateral e intencionalmente manipulados pelo humano. Em consonância com as abordagens sistêmicas e situadas da cognição e do comportamento, proponho a observação e a descrição do acoplamento estrutural entre aves e humanos no Parque dos Falcões como um domínio linguístico, ou seja, um espaço relacional coontogênico e recursivo, responsável pelo modo como nós, observadores, distinguimos a dinâmica estrutural coordenada no encontro entre dois ou mais organismos. Nos termos da escola chilena conhecida como Biologia do Conhecer, a linguagem é uma coordenação consensual de condutas, ou seja, um domínio linguístico estabelecido na recorrência e na recursão de ações consensuais coordenadas. Esta comunicação faz referência, em particular, à pesquisa que vem sendo realizada no âmbito do Departamento de Letras de Itabaiana, da Universidade Federal de Sergipe, desde agosto de 2017.
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